Ministério Público abre 32 processos para apurar descumprimento da lei que incentiva o ingresso de jovens no mercado de trabalho. Ao menos 80% das firmas estão irregulares.
O Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal (MPT-DF) abriu 32 investigações contra empresas que não cumprem a cota mínima de jovens aprendizes em seus quadros de pessoal. Pela legislação, companhias de grande porte devem destinar entre 5% e 15% das vagas a meninos e meninas com idade entre 14 e 24 anos. Somente no ano passado, quase 80% das oportunidades que deveriam ser destinadas a esse público não foram preenchidas. Não à toa, pesos-pesados como Petrobras, Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), Correios e Ministério da Pesca e Aquicultura estão na lista dos suspeitos de irregularidades.
A estimativa é de que, por causa do descaso, pelo menos 1 milhão de jovens perderam a chance de ocupar um posto no mercado formal no ano passado. O estado que registrou o melhor resultado, o Espírito Santo, só preencheu 9.583 vagas de aprendizes em 2011, o que equivale a 42% de um total de 22.805. Em segundo lugar ficou o Rio Grande do Sul, com 33,67% de ocupação. O Distrito Federal apareceu na terceira posição, com 33,67% (veja quadro). Os piores índices ficaram com Pernambuco (9%), Paraíba (10,8%) e Maranhão (12,1%).
As empresas consideram que a lei se tornou um grande motivo de dor de cabeça. Muitas, quando não desconhecem a regra, justificam que é difícil encontrar mão de obra que atenda aos requisitos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). "Além disso, há o caso dos menores de idade, que não podem trabalhar em alguns tipos de atividade, como insalubre ou noturna. Nessa situação, muitas firmas entendem que, se há 100 vagas nesse perfil, elas não devem entrar no cálculo da cota. Mas nem sempre o governo vê da mesma forma", explica o advogado especializado em trabalho Otavio Pinto e Silva, sócio do Siqueira Castro Advogados.
A procuradora do Trabalho Valesca Monte, coordenadora de Combate à Exploração do Trabalho de Crianças e Adolescentes no DF, observa que a legislação não explicita quais companhias são obrigadas a contratar um menor aprendiz. A CLT dispensa da exigência empresas de micro e pequeno porte, além de entidades sem fins lucrativos que tenham por objetivo a educação profissional. "No entanto, a lei não estipula um número mínimo de empregados que a firma deve ter. O procurador precisa de uma sensibilidade muito grande para não fazer exigências descabidas. Dependendo do caso, exigir que se contrate um aprendiz significará fornecer mão de obra barata", ressalta.
Resistência
A resistência dos empresários em cumprir a cota de aprendizagem torna cada vez mais difícil a vida de estudantes como Jéssica Aparecida Costa Pereira. Após dois anos procurando uma vaga pelo programa de jovens aprendizes, ela conseguiu a primeira oportunidade aos 17 anos. Há um mês, trabalha quatro horas diárias em digitalização, cadastro e arquivamento de documentos de uma estatal.
Jéssica relata que, até conseguir o estágio, passou por mais de uma dezena de entrevistas, sem sucesso. Ela atribui a dificuldade à escassez de vagas para jovens aprendizes. "Tenho muitos colegas que passam pela mesma situação. Não há oportunidades", diz. Na opinião da estudante, as chances só começam a surgir à medida que os adolescentes vão ficando mais velhos, mesmo que o Ministério do Trabalho permita que jovens de 14 anos se inscrevam para os postos de aprendizes. "As empresas não querem colocar responsabilidades nas mãos de pessoas muito novas", observa.
O trabalho técnico está longe do sonho profissional de Jéssica, que pretende cursar educação física. A oportunidade de inserção no mercado de trabalho e o salário de R$ 203 - somados ao benefício de transporte de R$ 6 por dia -, no entanto, fazem com ela percorra, todos os dias, os mais de 30km que separam São Sebastião, onde vive, da empresa na Asa Norte. Para pagar as passagens, Jéssica conta que ainda tem que tirar outros R$ 3 diários do minguado salário. "O dinheiro é pouco, não dá para ajudar nas contas de casa ainda, mas a experiência profissional é válida, é necessária", afirma.
Em meio a tanta polêmica, as firmas dão inúmeras justificativas para não contratar aprendizes, o que prejudica o objetivo do Ministério Público de erradicar o trabalho infantil. Procuradas pelo Correio, a Petrobras e a Infraero informam que nem sequer tiveram conhecimento de que estão sob investigação. A Infraero ressalta que cada uma de suas unidades é responsável por cumprir, de forma descentralizada e autônoma, as determinações da lei. Na sede da empresa, há 14 jovens trabalhando.
A Petrobras assegura ter 2.312 jovens admitidos pelo programa Petrobras Jovem Aprendiz em 26 unidades, o equivalente a 7,68% do efetivo de empregados de nível médio. A Petrobras informa ainda que a Superintendência de Fiscalização Regional do Ministério do Trabalho fixou prazo até 25 de maio para que ela apresente a documentação dos jovens admitidos pelo processo seletivo.
O Ministério da Pesca e Aquicultura, por sua vez, não informa quantos jovens possui atualmente trabalhando no local. O órgão diz entender que não é obrigado pela lei a cumprir a cota, mas que investiga junto ao Ministério do Trabalho a obrigatoriedade de contratação dos estudantes. Já o problema dos Correios não vem de hoje. Em 2009, a empresa firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o MPT. Até o fechamento desta edição, a estatal não informou se havia cumprido a cota.
Fonte: Correio Braziliense
Nota de responsabilidade:
As informações aqui veiculadas têm intuito meramente informativo e reportam-se às fontes indicadas. O Colégio Notarial Seção RS não assume qualquer responsabilidade pelo teor do que aqui é veiculado. Qualquer dúvida, o consulente deverá consultar as fontes indicadas.