O professor Luiz Carlos Weizenmann abriu as discussões do Grupo de Estudos Notariais lembrando que as cláusulas de incomunicabilidade, inalienabilidade e impenhorabilidade são atos extremamente comuns no dia a dia dos tabelionatos. E salientou que “sempre tive uma certa preocupação com estas cláusulas, porque elas são muito poderosas e muito restritivas. Elas têm uma função extremamente grave na utilização dos imóveis - principalmente a inalienabilidade, porque ela limita alguns direitos das pessoas em relação ao que elas podem fazer com os imóveis”.
O que ocorre com esta cláusula é que ela restringe direitos, tanto dos herdeiros quanto dos donatários. Tem caráter protetivo, que teoricamente, tem como objetivo evitar a dilapidação do patrimônio, por parte de quem recebe”.
Na prática, “o que acontece em determinados casos é a imposição de cláusulas sem critérios. Às vezes as pessoas que colocam as cláusulas não têm a exata noção das razões pelas quais estão colocando”. Por isto, a importância da atuação do notário para orientar sobre a extensão destas cláusulas e os seus reais efeitos para o beneficiário da doação ou do testamento.
Luiz Weizenmann também levantou a questão de que “o testador impõe cláusulas normalmente por dificuldade de desapego de seu patrimônio, e acaba transferindo este apego para após a sua morte. O que não teria fundamento. Mas isto acontece”.
O professor chamou a atenção também para o fato de que “inalienabilidade implica necessariamente em impenhorabilidade e incomunicabilidade”.
Qualquer destas cláusulas, por ser uma disposição voluntária de quem dispõe do bem, só pode ser imposta em atos gratuitos.
Inalienabilidade - Um imóvel gravado com a cláusula de inalienabilidade faz com que o beneficiário se torne algo semelhante a um usufrutuário. Ele não vai poder usar este imóvel nem mesmo como garantia de um financiamento.
Pela potência e pelo efeito drástico que esta cláusula tem, é preciso ter muito cuidado ao se impor num ato de disposição de bens, porque ela impede qualquer tipo de alienação, inclusive de constituir direito real. A pessoa recebe o imóvel, vai poder até alugar, mas não pode vender, nem usar como garantia. Muitas vezes o imóvel acaba sendo um peso para quem recebe, pela falta de recursos para manter.
Por isto, Luiz Carlos Weizenmann insistiu nos cuidados que os tabeliães devem ter em orientar e esclarecer sobre os efeitos desta cláusula, “que é usada de uma forma mais corriqueira do que a gente imagina”.
De acordo com o professor, “a cláusula pode ser absoluta ou relativa. Absoluta é quando o receptor não poderá dispor de nenhuma forma do bem. Quando o doador ou testador impõe a cláusula mas estabelece permissões e imposições, fica mais fácil para o beneficiário. A cláusula de inalienabilidade pode ser temporária também. “Muitas vezes o doador ou testador pode estar preocupado em garantir que a pessoa tenha onde morar por um determinado tempo, ou por alguma questão específica. Neste caso ela se torna bem mais razoável. Normalmente ocorre quando se trata de um beneficiário mais jovem, em que o doador ou testador tem medo de responsabilidades.
Outra preocupação que os notários devem ter na hora de orientar o testador ou doador, é que “o beneficiado vai pagar impostos e ter custos com o bem a vida inteira, e não vai poder dispor deste bem, beneficiando seus herdeiros futuramente”.
Impenhorabilidade é uma cláusula bem mais razoável. O objetivo é impedir que o imóvel seja usado como penhora. Se a ideia é proteger a pessoa que está recebendo, é uma cláusula que sozinha é bem justificável e bem mais razoável.
Incomunicabilidade - Esta é uma cláusula que só tem efeito na comunhão universal de bens. A finalidade é proteger os bens da herança ou doados, impedindo que integrem o patrimônio do cônjuge do herdeiro ou donatário.
Em caso de divórcio, estes bens não entrariam na partilha. Os bens particulares não participam da partilha.
A incomunicabilidade não tem nada ver com sucessão. Ela só tem efeito enquanto vivo o casal. Falecido o cônjuge do herdeiro, é o mesmo efeito da comunhão parcial de bens. Imóvel não vai para o processo de inventário. Se falecer o beneficiado com o bem com cláusula de incomunicabilidade, o cônjuge concorre como herdeiro, na comunhão universal de bens. Este imóvel entra na herança, com o cônjuge concorrendo com os herdeiros, nos bens particulares. Se o regime de bens for o parcial, o cônjuge também herdaria, em concorrência com os outros herdeiros (filhos). No caso da inalienabilidade teria o mesmo efeito.
Até 2002, quando entrou em vigor o novo Código Civil, o testador podia impor cláusulas sobre a totalidade do seu patrimônio. A partir do novo Código, pelo Artigo 1.848 do atual Código Civil, há a exigência da justificativa para as imposições feitas pelo testador sobre a legítima do herdeiro.
Na parte disponível, o testador pode impor a cláusula que quiser. Ninguém vai poder discutir. Nos casos de imposição nas legítimas, com justa causa, o herdeiro, o cônjuge do herdeiro ou o credor do herdeiro é que poderão questionar se a clausula é justa ou não.
Pontos de destaque:
- Não há previsão específica para beneficiário pessoa jurídica em cláusulas de inalienabilidade, incomunicabilidade e impenhorabilidade. Mas é aconselhável prever tempo para a vigência da cláusula.
- Importante - a imposição da cláusula de inalienabilidade na legítima precisa indicação de justa causa. Ao tabelião não cabe julgar se a justificativa é razoável; apenas cabe ao profissional registrar a justificativa no documento.
- Ao tabelião cabe orientar para que as razões sejam claras e colocadas da forma mais minuciosa possível, mas não cabe ao tabelião avaliar se a causa é justa ou não. Ao tabelião cabe apenas transcrever aquilo que o testador pediu. Quem vai decidir é o Judiciário depois, quando os herdeiros fizerem suas contraposições.
- Revogação das cláusulas - podem ser revogadas ou canceladas por consenso das partes. Se forem impostas por casal e um deles falecer, o remanescente pode revogar até 50% do total de bens - a parte que lhe é cabida por direito.
- Extinção - somente com a morte do beneficiário, se as cláusulas forem vitalícias. Se forem temporárias, se extinguirão quando os prazos forem cumpridos.
A próxima edição do Grupo de Estudos Notariais está agendada para o dia 6 de julho, quando serão discutidos “Testamento vital - diretivas antecipadas de vontade”.
Fonte: Assessoria de Imprensa