Em razão dessa linha tênue entre namoros, namoros
qualificados e uniões estáveis, tem crescido a busca por contratos de namoro
Em razão da pandemia de Covid 19, muitos casais passaram a
“quarentenar” juntos, dividindo o mesmo espaço físico, as despesas de
supermercado, o condomínio e, por que não, as angústias desses tempos tão
preocupantes.
Diante dessa nova realidade, as pessoas têm demonstrado a
preocupação de que seus namoros tenham se transformado em verdadeiras uniões
estáveis, com as consequências jurídicas dela advindas, já que os companheiros
passaram a ter, sob certas condições, direito à alimentos, à divisão de bens (ao
final da relação) e direito à herança, na hipótese de um deles vir a falecer
durante a união estável.
A lei brasileira, apesar de fixar os requisitos para que uma
relação seja assim considerada, não adota elementos objetivos para a sua
configuração, já que reconhece como entidade familiar a união estável entre o
homem e a mulher, cujo relacionamento seja público, contínuo, duradouro e
constituído com o objetivo de constituir família.Apesar de a lei só se referir
ao relacionamento entre homem e mulher, desde o julgamento, pelo STF, da ADI
4277 e da ADPF 132, foi reconhecida, também, a união estável entre casais do
mesmo sexo.
A menção da lei à convivência pública, contínua e duradoura
importa em dizer que deverá haver um relacionamento íntimo e a convivência
deverá ser ostensiva, não podendo ser clandestina, com encontros furtivos e
secretos. Não há impedimento para que os conviventes tenham uma união discreta,
mas é indispensável que dela tenha conhecimento, ao menos, o círculo social dos
conviventes.
A relação precisa, também, ser contínua, isto é, não poderá
ser eventual e esporádica, ou acontecendo apenas em curto espaço de tempo,
valendo ressalvar que relações sexuais, sem a intenção de constituir família,
também não tem o poder de caracterizar, por si só, uma união estável.
Ao contrário do que muita gente pensa e difunde nos meios
sociais, a lei civil não fixa um período mínimo de convivência para o
reconhecimento da união estável (o INSS exige, para fins exclusivamente
previdenciários, a comprovação de convivência mínima de 2 (dois) anos entre os
companheiros, para a concessão de pensão por morte).
Não é indispensável, também, que o casal viva debaixo do
mesmo teto, mas esse é um forte elemento para que, desde que presentes os
outros requisitos, um juiz reconheça a união estável
Quanto ao objetivo de constituir família, ele deve ser
compartilhado por ambas as partes, podendo ser comprovado pelo comportamento
dos conviventes, que devem se conduzir como se casados fossem e aos olhos dos
outros precisam se apresentar como uma família.
Muitas pessoas associam o “objetivo de constituir
familia” com o plano de ter filhos, mas
isso não é, por si só, uma exigência da lei, pois, mesmo que não se planeje uma
prole comum, ou quando esse plano não se concretize, ou ainda, quando o casal é
infertil, poderá existir a intenção de partilharem a vida.
É importante diferenciar a expectativa de constituir
familia, projetada para o futuro, chamada pelo Superior Tribunal de
Justiça-STJ, de ”namoro qualificado”, daquelas situações em que a familia já
está constituída.
Em razão dessa linha tênue entre namoros, namoros
qualificados e uniões estáveis, tem crescido, principalmente em tempos de
pandemia, a busca por contratos de namoro, registrados em cartório, que
evidenciem que o casal apenas namora, não se sentindo, portanto, casados.
Apesar de haver um número cada vez maior de contratos dessa
espécie, é importante lembrar que eles só terão validade se refletirem a
realidade do relacionamento, por isso, a sua simples elaboração, não tem o
condao de transformar uma suposta união estável em namoro.
Significa dizer que, se você tem um documento assinado, isso
poderá facilitar a produção da prova, na hipótese de seu ex-namorado/namorada
pretender buscar na justiça uma pensão alimentícia ou a divisão dos bens
adquiridos durante o período em que estiveram juntos. Isso não induz, contudo,
que estará garantida uma decisão judicial reconhecendo que o vínculo que os
unia era apenas de namoro, se ficar comprovado o contrário.
Tendo em vista o que foi dito acima, conclui-se que é
preciso mais do que a mera cohabitação dos namorados durante a pandemia de
Covid 19, para que haja o reconhecimento de uma união estável. É necessário que
fique comprovado uma convivência pública, contínua, duradoura e que ambos se
sintam, verdadeiramente, casados.
Fonte: Jota