Nesta semana, a Lei da Mediação (Lei nº 13.140/2015)
comemora cinco anos desde a sua publicação, ocorrida em 26 de junho de 2015. A
opção pela expressão comemoração aqui é provocativa, ou talvez variável, conforme
o ponto de vista. Fato é que se trata da lei que positiva os procedimentos
tanto da mediação entre particulares quanto da autocomposição na Administração
Pública, de uma forma mais abrangente do que as previsões constantes na
Resolução nº 125/2010, do Conselho Nacional de Justiça.
Com efeito, a Resolução nº 125/2010 serviu para instituir
uma política judiciária de adoção de mecanismos consensuais de
solução de controvérsias no âmbito do Poder Judiciário, cujos esforços são
coordenados e empreendidos por meio dos núcleos e centros especializados,
valendo-se do auxílio de mediadores e conciliadores judiciais. A Lei da
Mediação, por sua vez, também incluiu na sua disciplina a mediação
extrajudicial, por meio de mediadores igualmente denominados mediadores extrajudiciais.
Com essa breve introdução, já é possível contextualizar a
comemoração da publicação da lei, a depender do ponto de vista. No que diz
respeito à mediação judicial, é possível perceber algum avanço, especialmente
agora, em virtude da pandemia, em que o CNJ lançará
plataforma online para dirimir conflitos relacionados à Covid-19.
No que diz respeito à mediação extrajudicial, a
comemoração revela-se mais tímida. A opção da realização de mediação pelos
advogados, em seus escritórios, com a contratação de um mediador profissional
reconhecido no mercado, ainda é uma realidade a ser consolidada, assim como a
opção pelo uso de câmaras privadas e de plataformas online. Alguns
fatores podem explicar tal cenário, em especial se compararmos o implemento da
mediação no Brasil com os Estados Unidos, onde a prática da mediação é
largamente utilizada pelos escritórios de advocacia, inclusive com preferência
à arbitragem.
O sistema Múltiplas Portas naquele país (Multi-door
Courthouse) foi concebido pelo professor da Universidade de Harvard, Frank
Sander. Em entrevista concedida no ano de 2008 [1], o professor atribui a evolução da implementação
do sistema de múltiplas portas à ocorrência de alguns fatores políticos,
legislativos e sociais. Além do apoio que recebeu do governo americano,
Frank Sander ressalta a importância do suporte que os advogados deram à
causa. Inclusive, narra o professor que, em razão de legislação existente em
alguns Estados americanos, o advogado tem o dever ético de informar aos seus
clientes as diversas possibilidades de se resolver a disputa, e não somente
encaminhar o caso para o Judiciário [2].
Por fim, Frank Sander
igualmente destaca a relevância da educação em métodos alternativos de
resolução de disputas a fim de que sua prática seja efetivamente difundida,
tanto para profissionais já formados como para estudantes em nível de
graduação.
Despontam-se aqui
grandes diferenças quanto à implementação da mediação nos Estados Unidos e no
Brasil: enquanto naquele país o movimento emergiu essencialmente por meio dos advogados
e da academia, em solo brasileiro o protagonismo na implementação da mediação
vem ocorrendo por meio do próprio Poder Judiciário, sendo a mediação
apresentada à sociedade como um procedimento muito mais judicial que
extrajudicial.
Contudo, talvez seja
precipitado dizer que no Brasil há um modelo "multiportas" nos
moldes do fórum multiportas norte-americano. Isso porque transplantar um modelo
de uma cultura para outra tem seus entraves. Como lembra Warat, os americanos
têm a autodeterminação bem desenvolvida, retratam uma cultura que decide sobre
seu próprio destino e até sobre o dos demais [3]. Por outro lado, o brasileiro parece
mais acostumado a ter seus conflitos decididos por um terceiro, que diz quem
detém a razão. Se multiportas diz respeito a ter à disposição instrumentos
outros que não o processo judicial, então seria possível afirmar que outras
portas existem, mas que ainda são desconhecidas de muitos cidadãos.
O que se quer aqui é chamar a atenção para o fato de que a
mediação e os demais métodos alternativos de resolução de conflitos, tal como
originariamente concebidos nos Estados Unidos, partiram de um contexto bastante
plural, em que diversos segmentos da sociedade e do sistema de justiça
contribuíram para o seu desenvolvimento. Longe de querer adotar soluções
iguais, é certo que lá não houve um protagonismo exclusivo do sistema de
justiça na sua aplicação, tal como se deu com a Resolução nº 125/2010 e agora
com a aplicação da Lei da Mediação.
No Brasil, a partir da análise aqui brevemente exposta, o
que se percebe é que o seu desenvolvimento está muito mais vinculado a uma
atividade estatal — no âmbito dos tribunais, por meio de juízes e auxiliares de
Justiça — do que à autonomia das partes na opção pelo procedimento, em espaços
diversos do Judiciário e com a assessoria técnica de seus advogados.
No entanto, o procedimento da mediação exige um afastamento
da estrutura fixa e formal que é inerente aos órgãos de Justiça, de modo que às
partes e seus advogados seja propiciada uma maior liberdade de diálogo, com
ampla autonomia de tempo e de procedimento, com reais possibilidades de
aproximação. O incentivo legal para tanto já existe há cinco anos, ainda
estamos no desafio de implementá-la.
Fonte: Consultor Jurídico