O destino da herança
deixada por alguém depende de fatores como a configuração familiar no momento
da morte e a existência de testamento. Para entender quem fica com os bens da
pessoa que morreu, é necessário observar uma série de regras e exceções.
Companheiro em união
estável tem direito à herança? Posso receber alguma coisa de um primo que
faleceu? Um filho pode ser deserdado? Um cônjuge pode ficar sem receber nada?
Entenda as principais regras.
Falecido deixou testamento?
Esta é a primeira pergunta que precisa ser feita. No Brasil,
uma pessoa tem liberdade total para escolher o que acontecerá com até metade do
seu patrimônio depois que morrer. Isso é feito por meio de um testamento.
Dentro dessa margem, ela pode prestigiar um amigo querido, privilegiar um dos
filhos que passa por dificuldades financeiras ou doar a uma ONG, por exemplo.
Mas pelo menos 50% precisam ser divididos entre parentes
definidos na lei (chamados herdeiros necessários).
Por isso, as regras explicadas a seguir valem para, no
mínimo, metade do patrimônio deixado pela pessoa falecida. Caso ela não tenha
feito testamento, o valor total do patrimônio vai ser dividido segundo os
mesmos critérios.
Quem são os herdeiros necessários?
Os herdeiros necessários são
·
Descendentes: filhos, netos, bisnetos, trinetos,
tataranetos
·
Ascendentes: pais, avós, bisavós, trisavós,
tataravós
·
Marido, esposa, companheiro ou companheira
Eles só podem ser excluídos da herança em casos
excepcionais, como crimes que os tornem "herdeiros indignos" (veja o
item "quem pode ser deserdado" mais abaixo).
Isso não significa que todos terão direito à herança, porque
existe uma ordem de preferência (entenda melhor a seguir).
Irmãos, tios, sobrinhos e outros parentes colaterais são
herdeiros facultativos. Eles podem acabar ficando com parte da herança em
situações específicas explicadas mais abaixo.
Marido, esposa, companheiro ou companheira
O STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu que não existe
diferença de herança para pessoas casadas ou em união estável. Por isso, a
palavra "cônjuge" usada neste texto deve ser interpretada como
marido, esposa, companheiro ou companheira.
Para entender como fica a situação dessas pessoas, é
necessário diferenciar meação de herança:
·
Meação é o direito do cônjuge à divisão do
patrimônio comum do casal, que varia conforme o regime de bens escolhido
·
Herança é o patrimônio que será deixado depois
da morte de alguém
A situação mais frequente é a comunhão parcial de bens,
porque é o regime padrão —só será diferente se o casal optar expressamente por
outro formato. Na comunhão parcial, o cônjuge já é dono de metade do patrimônio
formado durante o casamento ou união estável. Essa parte (a meação) não entra
no conjunto que será dividido entre herdeiros (a herança).
Além da meação, o cônjuge pode ter direito a dividir a
herança com os filhos. Isso depende do tipo de regime de bens entre o casal.
Por exemplo, o regime de comunhão parcial dá direito a herança sobre alguns
bens. O regime de comunhão total não dá, porque o cônjuge já é dono de metade
de tudo.
Se a pessoa que morre não deixa filhos ou pais vivos, o
cônjuge herda tudo —independente do regime de bens do casal.
Cônjuge perde o direito à herança se estiver:
·
Divorciado
·
Separado judicialmente
·
Separado de fato há mais de dois anos
Filhos
Filhos nunca ficam de fora da herança, exceto se forem
deserdados ou considerados indignos (veja mais no tópico "quem pode ser
deserdado", mais abaixo).
Eles podem ter de dividir a herança com o cônjuge,
dependendo do regime de bens do casal, conforme explicado acima. Em alguns
casos, netos e bisnetos também podem participar da divisão junto com os filhos
(entenda melhor no tópico seguinte).
A divisão da herança entre os filhos é igualitária (salvo se
a pessoa que morrer privilegiar um deles no testamento, respeitado o limite de
50% do patrimônio total). Não existe mais diferenciação entre filhos concebidos
dentro ou fora do casamento.
Também tem direito à herança o filho já concebido, que nasce
depois que a pessoa morre. Se a gestação for interrompida ou o bebê nascer sem
vida, não é levado em conta na divisão da herança.
É preciso lembrar que o dono dos bens pode fazer o
testamento e deixar metade de seu patrimônio para quem quiser, mesmo que não
sejam filhos. A prioridade dos filhos é para a parte que sobrar, se houver
testamento.
Netos, bisnetos, trinetos e tataranetos
Para outros descendentes diretos (netos, bisnetos, trinetos
tataranetos), existe o direito de representação. Isso significa que eles podem
ficar com a parte da herança que caberia a um filho da pessoa que deixou
herança.
Por exemplo: João morreu. Ele tinha quatro filhos, mas um
deles (Ricardo) morreu antes de João. Ricardo deixou três filhas vivas, netas
de João. Cada uma dessas netas terá direito a 1/3 da herança que caberia a
Ricardo.
Esse direito de representação se estende sem limite entre
descendentes diretos, como bisnetos, trinetos e tataranetos.
Pai e mãe
Os pais só têm direito à herança se a pessoa falecida não
deixar descendentes (filhos, netos, bisnetos, trinetos e tataranetos). Eles têm
que dividir parte do patrimônio com o cônjuge do falecido, independente do
regime de bens que o casal mantinha.
Avós, bisavós, trisavós e tataravós
Só têm direito à herança se a pessoa que morreu não deixou:
·
Descendentes diretos (filhos, netos, bisnetos,
trinetos e tataranetos)
·
Pais
·
Marido, esposa, companheiro ou companheira
Nesse caso, não existe direito de representação. Assim, o
ascendente mais próximo exclui os mais distantes. Por exemplo: uma avó vai
excluir um bisavô da herança (exceto se o bisavô estiver contemplado no
testamento, dentro dos 50% que pode ser destinados livremente).
Irmãos, sobrinhos, tios, tios-avós e primos
Esses são os principais parentes colaterais considerados
herdeiros facultativos. Se não forem contemplados no testamento, só terão
direito à herança caso não esteja vivo nenhum dos outros familiares listados
acima.
Diferentemente dos herdeiros necessários, os herdeiros
facultativos podem ser excluídos no testamento pela simples vontade do dono do
patrimônio.
Quem pode ser deserdado?
A lei prevê casos em que o próprio dono do patrimônio pode
excluir herdeiros necessários. Isso só é permitido por meio do testamento, com
indicação expressa da causa.
Para deserdar descendentes (filhos, netos e bisnetos), o
dono do patrimônio pode alegar:
·
Que sofreu ofensa física ou injúria grave
·
Que o descendente teve relações ilícitas com a
madrasta ou com o padrasto
·
Que ficou desamparado pelo descendente quando
passava por problemas graves de saúde
Para deserdar ascendentes (mãe, pais, avós, bisavós), pode
alegar:
·
Que sofreu ofensa física ou injúria grave
·
Que o ascendente teve relações ilícitas com
cônjuge do filho, da filha, do neto ou da neta
·
Que ficou desamparado pelo ascendente quando
passava por problemas graves de saúde
Além disso, a pessoa que praticou ato considerado indigno
contra quem deixou herança pode ser excluída da partilha, independente do grau
de parentesco. Os principais exemplos são:
Se participou do homicídio ou tentativa de homicídio contra
a pessoa que deixou herança (ou contraparentes dela)
Se cometeu crime contra a honra da pessoa que deixou herança
(ou contraparentes dela)
Se praticou violência ou fraude para impedir que a pessoa
decida livremente para quem ela pretende deixar a herança
A exclusão do herdeiro indigno precisa passar por processo
judicial. Os herdeiros interessados devem entrar com a ação após a morte de
quem deixou a herança. Nos casos de homicídio ou tentativa de homicídio, o
Ministério Público também pode tomar a iniciativa.
Herança sem herdeiros
Existe ainda a possibilidade de toda a herança ficar com o município
ou o Distrito Federal. Isso acontece se a pessoa não deixar testamento e não
houver herdeiros conhecidos (ou se todos eles renunciarem à herança).
Fonte: Uol