Dados do Colégio Notarial do Brasil sinalizam que, de 2015 a 2018, os
meses de outubro a dezembro foram os que mais registraram dissoluções
matrimoniais no Estado
Não existe regra. Na hora de
assumir ou romper um relacionamento amoroso não é possível preestabelecer uma
melhor época do ano para fazê-lo. No entanto, dados do Colégio Notarial do
Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS) sinalizam algo que pode ser uma
tendência entre os moradores do Rio
Grande do Sul: a de assinar o divórcio no
fim do ano.
Conforme o levantamento da
CNB/RS, de 2015 a 2018, os últimos trimestres foram os que mais registraram dissoluções
matrimoniais no Estado. O pico ocorreu no ano passado, quando os tabelionatos
de notas tiveram 1.929 divórcios entre outubro e dezembro. Nos anos anteriores,
o índice foi de aproximadamente 1,7 mil divórcios/ano nos últimos
trimestres.
Nos Estados
Unidos, uma pesquisa tentou investigar a relação entre dados e datas, no
entanto, os resultados obtidos não passam de hipóteses. Publicado em 2016, o
levantamento feito pela University of Washington ao longo de mais de uma década
mostrou que a tendência era um maior número de divórcios em março e em agosto,
períodos pós inverno e férias de verão no país. Julie Brines, professora de
sociologia que conduziu a pesquisa, sugeriu, à época, que esses picos fossem
resultado tanto da frustração com as férias quanto do ajuste financeiro
familiar para arcar com os custos da separação, o que ocorreria mais em
março.
— O divórcio é multifatorial,
pois há uma série de questões relacionadas à conjugalidade. Por isso fica
complicado especular qual é a razão máxima que faça eles se divorciarem em
determinado período — avalia o psicólogo especialista em terapia de casal e
família Gustavo Affonso Gomes, professor de Psicologia da Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
Da mesma forma que os dados
norte-americanos apontam suposições, os índices daqui também não têm uma razão
muito clara. Uma ideia aventada pela doutora em psicologia pela Universidad
Autónoma de Madrid Adriana Wagner é de que as pessoas se valem de demarcadores
para resolver algumas questões, e o fim de ano pode ser um deles. É como se o
prazo limite para solucionar algo cessasse até a virada do calendário.
— Mas é preciso lembrar que os
casais se separam muito antes. Os números que temos são apenas dos registros
civis. Nesses casos, pode-se ter um, dois e até cinco anos de separação —
pondera Adriana, que também coordena o Grupo de Pesquisa de Dinâmica das
Relações Familiares da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que
completa 25 anos neste ano.
Embora não seja possível
comprovar, ainda há a hipótese de que a proximidade com o verão mobilize mais
as pessoas. Como a estação tende a trazer mais vivacidade, é possível que
muitos aproveitem essas datas próximas para colocar fim em um ciclo.
— Vemos muitos namoros acabando
nesse período ou pessoas que não querem assumir nada nessa época em função do
verão. Há quem se envolva e ao mesmo tempo se freia em função do verão —
ilustra a psicóloga Andréa Alves.
Aqui, apesar de os números
indicarem essa propensão, não é possível cravar que todo o processo inicie e
termine dentro desses três meses. Isso porque para concluir o divórcio, é
preciso que as duas partes estejam de acordo e assinem o documento, o que
muitas vezes se arrasta por anos.
Na tabela a seguir, é possível
conferir o total de registros de casamentos e de divórcios no último trimestre
dos anos de 2015 a 2018, no Rio Grande do Sul. Os dados são do Colégio Notarial
do Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS) e da Central Nacional de
Informações do Registro Civil - CRC Nacional:
Casamentos e divórcios no último trimestre
ANO |
CASAMENTOS |
DIVÓRCIOS |
2015 |
12.983 |
1.782 |
2016 |
11.989 |
1.767 |
2017 |
11.976 |
1.722 |
2018 |
13.097 |
1.929 |
TOTAL |
50.045 |
7.200 |
O divórcio
Logo no dia seguinte ao Natal de
1977, o Brasil ingressou em um novo momento social de sua história. Naquela
data, a lei do divórcio (Lei 6.515/1977) foi sancionada. Desse movimento
inicial até agora, bastante coisa mudou. Uma delas foi a possibilidade de fazer
todo o processo em um tabelionato, garantida pela Lei 11.441/2007.
Mais rápido, fácil e barato, o
divórcio extrajudicial contabiliza, de 2007 até hoje, cerca de 650 mil
processos em todo o país, destaca Ney Paulo Silveira de Azambuja, presidente do
CNB/RS.
— Se em 2007 tivemos 19,7 mil
divórcios extrajudiciais no Estado, em 2018, chegamos a 70 mil. No início, pelo
desconhecimento ou falta de hábito dos advogados, houve uma certa resistência.
A partir do momento em que perceberam que um processo no Judiciário levava
cerca de seis meses a um ano e no tabelionato isso poderia ser feito em um dia,
aumentou a procura pelo divórcio extrajudicial.
Para fazer o divórcio
extrajudicial, é necessário que haja consenso entre as partes, ausência de
filhos menores e/ou incapazes e pelo menos um advogado para o casal.
A decisão
Falta de diálogo e de experiência
na vida a dois são apontados por Adriana como fatores que impulsionam o
afastamento entre casais. Dessa forma, a separação se torna a maneira mais
fácil de solucionar conflitos.
— Divórcio era o fim da linha
para um casal no passado. Hoje, ele é uma das estratégias para resolver
conflitos. As pessoas estão mais despreparadas para enfrentar conflitos íntimos
e, então, decidem pela separação, pois não é mais um tabu ser divorciado.
Estamos trabalhando com um conceito novo de educação para a conjugalidade. Os
casais podem aprender a ser casais. A gente não faz gestão de empresa? Vamos
fazer gestão de conflito sem que ele seja um sintoma já estabelecido — diz a pesquisadora
da UFRGS, que trabalha justamente isso com grupos de casais.
Gomes, por sua vez, aposta na
comunicação para buscar resolver os problemas e acertar os ponteiros. Segundo
ele, os casais andam menos tolerantes e mais apegados aos defeitos do
outro.
— Eles têm olhado pouco para as
diferenças enquanto diferenças, mas sim como defeitos. Isso acaba dificultando
a comunicação. Um aponta o dedo para o outro e não olha para si.
Se a discussão entre os
envolvidos não for possível, a recomendação é buscar ajuda profissional e
investir em uma terapia de casal.
Fonte: Gaúcha ZH