O casamento geralmente simboliza
a realização de um sonho. Enquanto instituto jurídico, o casamento possui
efeitos pessoais e patrimoniais. Além de constituir um laço amoroso e afetivo,
o matrimônio não deixa de ser uma espécie de contrato, em que os noivos
precisam escolher o regime de bens que se aplicará nas questões de ordem
financeira e patrimonial.
Em regra, o Código Civil Brasileiro
estabelece como regime a ser aplicado ao casamento o da comunhão parcial de
bens, que estabelece, essencialmente, a formação de duas massas patrimoniais:
uma formada pelos bens adquiridos antes e outra pelo patrimônio adquirido
depois do casamento.
É possível a escolha de outro
regime. Para isso, o casal deve se dirigir até um Tabelionato de Notas e lavrar
uma Escritura Pública de pacto antenupcial, quando poderão estabelecer que as
relações patrimoniais decorrentes do casamento sejam disciplinadas pelo regime
da comunhão universal de bens, da separação de bens e da participação final dos
aquestos.
Existem situações em que a lei
impõe a adoção do regime da separação de bens, como é o caso dos
septuagenários, pessoas com mais de 70 anos de idade que pretendem se casar. O
intuito dessa limitação é evitar a ocorrência de fraudes, o chamado “golpe do
baú”.
Contudo, em que pese a
obrigatoriedade do regime de separação de bens imposta pela lei, os Tribunais
Superiores possuem o entendimento de que, nessas situações, incide o
entendimento previsto na Súmula nº. 377 do STF.
Por força dessa súmula, ainda que
impere entre os nubentes septuagenários o regime de separação obrigatória de
bens, o patrimônio adquirido na constância do casamento se comunica com o outro
cônjuge, o que acaba por produzir, na prática, o direito à partilha dos bens
adquiridos onerosamente na constância do casamento.
Foi para enfrentar essa distorção
que o IBDFAM/MS, Instituto Brasileiro de Direito de Família e Sucessões de Mato
Grosso do Sul, formulou pedido de providências junto à Corregedoria-Geral de
Justiça do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Em acertada e brilhante
decisão, o Des. Sérgio Fernando Martins acolheu o pedido e editou o Provimento
nº 212 de 02 de setembro de 2019, que incluiu o artigo 645-A ao Código de
Normas da Corregedoria-Geral de Justiça.
Pelo novo Provimento, a pessoa
com mais de 70 anos que pretende-se casar pode lavrar uma Escritura Pública de
pacto antenupcial e afastar a incidência da Súmula nº 377, do STF, a fim de que
não haja direito ao recebimento de bens adquiridos onerosamente pelo casal na
constância do casamento.
Com esse posicionamento
vanguardista, a Corregedoria-Geral de Justiça do TJMS alinha-se ao que se tem
de mais atual no direito de família brasileiro, seguindo a orientação da
doutrina de Zeno Veloso, Flávio Tartuce e Mario Luiz Delgado, bem como de
provimentos já editados pelas Corregedorias de Justiça dos Estados de São Paulo
e Pernambuco, garantindo, ao fim e a cabo, o exercício da autonomia privada
pelos septuagenários que pretendem se casar, permitindo-lhes a gestão
patrimonial de seus bens e direitos.
*Elder Gomes Dutra é Doutorando em Direito pela FADISP/SP, Mestre em
Direito pela PUC/MG e ocupa a função de Tabelião do Cartório 5° Ofício de Notas
de Campo Grande/MS.
Fonte: Campo Grande News