Como tema inicial, abordo Direito Sucessório. A exposição será sucinta,
no intuito de auxiliar na compreensão popular.
Imagine a seguinte situação
hipotética:
Maria é mãe de Julia, Julio e
Clara. A primeira é adolescente, os demais são maiores de idade. Maria não é
casada ou unida estavelmente. Com a idade de cinquenta anos, sofre de problemas
de saúde, vindo a constituir dívidas para manter tratamentos e também para
auxiliar a filha menor de idade com seus estudos. Entretanto, Maria falece de
forma inesperada. Deixou bens móveis e imóveis, mas estes não são o suficiente
para saldar os débitos constituídos em vida.
Pergunta-se: Diante disso, os
herdeiros (que, neste caso, são seus filhos) terão de arcar com os débitos que
foram contraídos por Maria (em seu nome)?
A resposta é: o próprio
patrimônio de Maria é que vai responder por suas dívidas, até onde houver saldo
suficiente. Se todo o patrimônio deixado pela falecida não for capaz de
adimplir as dívidas, os herdeiros não terão responsabilidade pessoal por elas.
Para melhor responder essa
questão e fundamentá-la, devemos observar alguns conceitos essenciais. Vejamos:
O direito à herança é
previsto tanto pela norma constitucional, como pela infraconstitucional (Código
Civil de 2002). Tem como finalidade dar continuidade ao patrimônio deixado
pelo (a) de cujus (pessoa falecida) e amparar os herdeiros, pela
ideia de proteção e solidariedade que se tem na família.
O artigo 5º da Constituição
Federal de 1988, que narra os direitos fundamentais individuais, prevê
ser “garantido o direito de herança” (inciso XXX).
A herança é
compreendida como o conjunto de bens formado pelo falecimento do de cujus.
Quem falece é chamado de autor da herança. Os que a ele sobrevivem e darão
continuidade ao acervo são os herdeiros.
A herança é transmitida aos
herdeiros, o que ocorre tão logo o autor da herança venha a falecer (em razão
do princípio de saisine, artigo 1.784 do Código
Civil). Para a regularização desta transmissão, faz-se necessário o
procedimento judicial ou extrajudicial conhecido como inventário, grosso modo.
Todavia, para se chegar ao resultado da herança líquida, as dívidas são
abatidas na totalidade do patrimônio.
Isso significa dizer que a
responsabilidade pelas dívidas da pessoa falecida recai sobre seu próprio
patrimônio (no mesmo sentido versa o artigo 1.997 do CC).
O Código
Civil em seu artigo 1.792 observa
que “o herdeiro não responde por encargos superiores às forças da herança;
incumbe-lhe, porém, a prova do excesso, salvo se houver inventário que a
escuse, demostrando o valor dos bens herdados.”
Ainda, o inciso XLV, artigo 5º,
do texto
constitucional, observa que: “nenhuma pena passará da pessoa do condenado,
podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser,
nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até
o limite do valor do patrimônio transferido.”
Em síntese: débitos contraídos
pelo falecido, obrigações pecuniárias de reparar danos e perda de bens são
estendidos sobre seus herdeiros (ou sucessores), que irão quitá-los não com
seus próprios rendimentos, mas com o acervo de bens que se denomina de herança,
até onde houver saldo dela própria, ainda que esta não seja capaz de saldar na
integralidade os débitos do de cujus.
Os herdeiros respondem nos
limites do valor da herança, e não com seu próprio patrimônio. Se a pessoa
falece com dívidas e sem deixar qualquer bem, ainda assim os herdeiros não
serão responsáveis pelo adimplemento.
Para corroborar a explanação,
colaciono ementa de julgado pelo Tribunal de Justiça gaúcho:
Agravo de instrumento. Decisão
monocrática. Ação monitória. Falecimento devedor. Sucessores. Herança.
Responsabilidade nos limites da herança. Decisão mantida. – Conforme os
artigos 796 do
Código de Processo Civil e 1.792 do Código
Civil, efetivamente, os herdeiros respondem pelas dívidas do falecido
no limite da herança. – Agravada que logra êxito em comprovar a impossibilidade
da presunção de que o resultado da herança recebida, considerando que ocorrera
no ano de 2011, tenha resultado na compra dos veículos, que ocorreram nos anos
de 2013 e 2016. – Nada nos autos comprova a situação financeira da agravada
antes do recebimento da herança e o respectivo crescimento patrimonial para
poder afirmar que o veículo objeto do requerimento de penhora esteja nos
limites da herança. Agravo de instrumento desprovido. (Agravo de Instrumento,
Nº 70081473035, Décima Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Gelson Rolim Stocker, Julgado em: 20-05-2019)
*Alan Alex é jornalista, consultor em comunicação, editor, redator e
diretor
Fonte: Painel Político