Em entrevista ao
CNB/RS, a presidente da direção do CENoR, de Coimbra, fala sobre a importância
do notariado para a sociedade
Presidente da Direção do Centro
de Estudos Notariais e Registais (CENoR), em Coimbra, a Prof. Doutora Mónica
Jardim falou ao Colégio Notarial do Brasil – Seção Rio Grande do Sul (CNB/RS)
sobre a relevância do notariado e a importância de sua função para a
estabilidade social, a segurança jurídica e a boa administração da justiça. Em
entrevista, a pesquisadora portuguesa ressaltou o papel do notário como
profissional que garante o cumprimento da lei, evita litígios e assegura
confiança nas relações jurídicas e pessoais.
CNB/RS - De que forma o
trabalho do notário contribui para a paz social, evitando que os cidadãos
tenham longas e desgastantes disputas na Justiça?
Mónica Jardim - Prevenir e
evitar conflitos é consequência ou resultado normal da intervenção notarial.
Através da redação e autorização
de documentos válidos e conformes à lei, pelo seu conteúdo, e eficazes e
executórios pela sua forma, os notários facilitam, encurtam ou tornam
desnecessária a intervenção dos tribunais. Ademais, o notário exerce, a par da
função estritamente documental, uma função jurídica que corresponde, além de
outras tarefas, à adaptação, adequação ou conformação da vontade dos
particulares ao ordenamento jurídico.
Explicitando:
O documento notarial tem o
carácter de documento público e autêntico, goza da eficácia especial como meio
de prova (quanto aos fatos referidos como praticados pelo notário e ainda
quanto aos factos atestados com base nas perceções do notário) e tem força
executiva. E isto é assim, porque o legislador considera que o documento
notarial é obra de um especialista em Direito, que contribui de uma maneira
imediata e decisiva para que a vontade das partes, vertida no documento,
satisfaça as condições necessárias para a produção dos efeitos previstos na lei
e pretendidos pelos particulares.
Efetivamente, perante o
requerimento dos interessados, cumpre ao notário, desde logo, indagar sobre o
que as partes efetivamente pretendem (o que exige que escute atentamente e
tente obter, através de perguntas adequadas, a maior quantidade possível de informação).
Acresce que, a vontade que o
notário há-de indagar e à qual deve dar forma legal não é a de uma ou de outra
parte, mas a vontade comum. De facto, o notário, enquanto terceiro imparcial,
tem de cuidar dos interesses de ambas as partes e servir a vontade comum.
Uma vez determinados, claramente,
os propósitos dos requerentes, o notário deve informá-los do enquadramento
legal, do alcance dos seus direitos e obrigações, das consequências – não só
jurídicas, mas também, muitas vezes, económicas, familiares, patrimoniais e
sociais. O notário deve sugerir opções e dar o seu conselho, indicando aquela
que considera que melhor se harmoniza com os interesses revelados.
Só quando o notário está certo de que as partes compreendem o alcance jurídico do negócio é que reduz a vontade das partes a escrito, obtendo uma composição duradoura, e se possível definitiva, dos interesses opostos.
Em suma, a certeza que acompanha
a intervenção notarial, gera verdade, credibilidade, confiança e assim
segurança jurídica, tornando desnecessário que esta se estabeleça ou
restabeleça de forma coativa ou meramente ressarcitória por ação dos tribunais,
diminuindo os custos económicos e sociais.
CNB/RS - Por que o notariado é
indispensável?
Mónica Jardim - A resposta
a esta questão resulta do anteriormente afirmado. Não obstante, sempre
acrescentaremos.
O notariado é indispensável
porque a função do notário latino, com o seu amplo conteúdo de assessoria,
assegura a realização pacífica e espontânea do Direito, prevenindo futuros
litígios baseados no desconhecimento do ordenamento jurídico (desconhecimento
que hoje se agudiza perante crescente atividade legislativa), na falta de uma
verdadeira comunicação entre as partes, na existência de um desequilíbrio entre
elas, numa equívoca apreciação das consequências dos atos e negócios jurídicos,
etc.
A intervenção notarial harmoniza
os interesses das partes, dissipa mal entendidos e interpretações erróneas,
equilibra as relações, configura-as legalmente e dota-as – mediante a redução a
documento público – de força probatória e executiva, e por último, fomenta o
respeito pela autonomia da vontade e o cumprimento voluntário das obrigações,
reduzindo, consequentemente, custos pessoais, psicológicos, económicos e
sociais ao evitar consequências inicialmente não queridas, tais como o litígio,
com os seus habituais corolários de rutura de relações, incerteza quanto ao
tempo a despender e quanto à solução final, que só agradará a uma das partes,
pois se uma ganha, é porque a outra perde.
Ademais, a atividade notarial é
um instrumento que a generalidade dos ordenamentos jurídicos utiliza para
evitar o branqueamento de capitais ou a lavagem de dinheiro e a corrupção
Em síntese: a função notarial é,
indiscutivelmente, essencial para a boa administração da justiça.
CNB/RS - Poderia citar
exemplos de como o notariado está presente na vida das pessoas e empresas?
Mónica Jardim - As pessoas
recorreram ao notário quando, por exemplo, pretendem;
- Celebrar contratos de compra e
venda, doação, permuta de imóveis, mútuo com constituição de hipoteca ou
alienação fiduciária em garantia, convenção antenupcial, etc.
- Passar procuração para a
prática dos mais diversos atos.
- Elaborar autorização para que
um menor possa viajar.
- A autenticação de documentos, o
reconhecimento de assinaturas e a certificação de fotocópias.
- A emissão de certidões,
certificados de factos e autenticação de traduções.
- Realizar testamento público ou
aprovar testamento cerrado, para definir o destino dos seus bens após a sua
morte, bem como para fazer disposições de carácter pessoal (por exemplo,
perfilhar, reabilitar um indigno, etc.)
É também perante o notário que, quando alguém falece, ocorre a habilitação de herdeiros, o repúdio da herança e a partilha amigável de bens. Acresce que notário também pode ser o responsável por contactar os herdeiros após o falecimento.
Quanto às sociedades, consoante o
ordenamento jurídico, o notário pode/deve acompanhar toda a sua existência,
desde a constituição, nomeação e destituição de administradores, modificação,
transformação, mudança de sede, aumento e redução de capital, cisão,
extinção...
CNB/RS - Como a tecnologia,
como a assinatura digital e os atos eletrônicos, está modernizando o notariado
e tornando os serviços mais acessíveis para a população?
Mónica Jardim - No Brasil,
Através do provimento Nº 100 de 2020, foi implementada a celebração de atos
notariais à distância. Segundo este provimento, o sistema de atos notariais
eletrônicos no Brasil foi criado com os objetivos de interligar os notários,
aprimorar tecnologias e processos para viabilizar o serviço notarial em meio
eletrônico e implantar um sistema padronizado de elaboração de atos notariais
eletrônicos.
O ato notarial eletrônico é
gerido e formalizado unicamente através da plataforma e-Notariado, gerida e
administrada pelo Colégio Notarial do Brasil35.
O E-notariado brasileiro é um
exemplo a nível mundial, pois os restantes países, exceção feita à Estónia e à
Áustria, ainda dando passos, mais ou menos, incipientes nesta matéria. E, não nos esqueçamos que o Brasil tem
dimensão continental.
O E-notariado brasileiro,
permitindo a prática de atos à distância, nos quais tem de haver, de acordo com
a lei, a intervenção de um notário, trouxe inegáveis vantagens para o cidadão
brasileiro. Tal é manifesto quando se tem presente, por um lado, a dimensão
continental do Brasil e, por outro o facto de ter sido mantida a segurança
jurídica (oferecida pelo notário), essencial aos negócios jurídicos pessoais e
patrimoniais.
Fonte: Assessoria de Comunicação – CNB/RS