Cadastro
Imobiliário Brasileiro (CIB) tem o objetivo de montar um 'inventário' dos
imóveis no país, alimentado com dados dos municípios e cartórios
Fernanda
Valente, Bárbara
Mengardo
Previsto
na reforma
tributária e regulamentado pela Receita Federal em
agosto, o Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB) vai centralizar dados
relacionados a imóveis,
reunindo informações antes dispersas.
O
sistema é apontado como um elemento que dará maior transparência às transações,
reduzindo fraudes. Especialistas também apontam que há possibilidade de aumento
na carga tributária, considerando que os dados serão compartilhados com todas
as administrações, inclusive estados e municípios.
Importante
ressaltar, entretanto, que a regulamentação da reforma ainda está em curso. O
PLP 108, por exemplo, foi aprovado nesta quarta (17/9) pela CCJ do Senado,
e ainda deverá passar pelo plenário da Casa e pela Câmara. Pela complexidade do
regime especial voltado aos bens imóveis, é possível que ainda haja alterações
neste ponto.
Por
exemplo, na complementação de voto apresentada à CCJ, o relator do PLP 108,
senador Eduardo Braga (MDB/AM), promoveu alterações para definir o valor do
redutor de ajuste na hipótese de permuta entre contribuinte do regime regular
do IBS e da CBS e não contribuinte.
O
que é o CIB?
A
Receita Federal regulamentou o Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB) com
objetivo de ter um identificador único de imóveis urbanos e rurais, apelidado
de “CPF dos imóveis”. A ideia é ter um “inventário” dos imóveis no país,
alimentado com dados dos municípios e cartórios.
A
previsão consta na Instrução Normativa (IN) 2.275/2025, publicada em agosto. O
texto prevê que os cartórios devem adotar o código de identificação único no
CIB no prazo de 12 meses, conforme previsto na reforma tributária (LC 214/25).
O
texto também dispõe sobre o compartilhamento de informações e documentos
relacionados a operações com bens imóveis urbanos e rurais. Essa troca com as
administrações tributárias será feita pelos serviços notariais e de registro em
um sistema nacional de gestão de informações territoriais (Sinter).
O
que prevê a reforma
A
reforma estabelece que o CIB deverá conter obrigatoriamente todos os documentos
relativos à obra de construção civil expedidos pelo município. Também é
previsto que o Comitê Gestor do IBS e a Receita Federal poderão estabelecer, em
ato conjunto, obrigações acessórias para terceiros relacionados às operações,
inclusive tabeliães, registradores de imóveis e juntas comerciais.
A
apuração do IBS e da CBS será feita para cada empreendimento de construção
civil, vinculado a um CNPJ ou CPF específico. Cada obra, incorporação ou
parcelamento do solo será considerada um centro de custo distinto.
Nestes
casos, o documento fiscal deverá indicar o número do cadastro da obra nas
aquisições de bens e serviços utilizados na obra de construção civil a que se
destinam.
O
que será compartilhado e por quem?
No
caso dos imóveis urbanos, os dados serão fornecidos pelas prefeituras e, no
caso dos imóveis rurais, pelo Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR). No
caso dos imóveis públicos da União, os dados serão produzidos pela Secretaria
de Coordenação e Governança do Patrimônio da União (SPU).
De
acordo com a IN, a documentação vai abranger os bens imóveis registrados, para
fins de apuração de seu “valor de referência”. A reforma tributária considera
como valor de referência a estimativa de valor mercado dos bens imóveis, com
atualização anual (art. 256 da LC 214/25).
O
ponto deve ser foco de atenção dos contribuintes, segundo a advogada Natasha
Rumiko Pereira Makiyama, sócia de tributário do Rayes e Fagundes. “O valor de
referência oficial, adotado pelo fisco no CIB, restringirá subavaliações dos
imóveis, para fins de apuração da CBS e do IBS, tanto em operações societárias
envolvendo imóveis (como incorporações, cisões, fusões ou integralizações de
capital), quanto em escrituras públicas e contratos de locação, já que, em
eventual questionamento do fisco, a legislação permite o uso do valor de
referência como meio de prova para arbitramento do tributo”, explicou.
Em
que momento será compartilhado?
Os
serviços notariais e de registro deverão compartilhar as informações
imediatamente após a lavratura ou registro de ato relativo a imóvel. Isso será
feito por meio de um sistema eletrônico da Receita, integrado ao Sinter.
Para
Natasha Makiyama, o compartilhamento automático de informações sobre o imóvel
“vai permitir a identificação de discrepâncias nos valores transacionados entre
os contribuintes e o valor de mercado, por exemplo”. Com isso, será possível o
“arbitramento do valor da operação, com base no valor de referência
atualizado”.
As informações deverão ser enviadas de forma estruturada, conforme
especificações técnicas que serão definidas pela Receita Federal.
Há
previsão de sanção?
Em
caso de descumprimento das obrigações, a IN prevê aplicação de multas, além de
sanções administrativas aplicáveis pelos órgãos de fiscalização notarial e
registral.
Vai
aumentar a carga tributária?
A
advogada Natasha Makiyama entende que há tendência de aumento na carga
tributária. Isso porque “o CIB será compartilhado com todas as administrações
tributárias, inclusive estados e municípios, e o valor venal do imóvel
atualizado será um parâmetro para que estados e municípios avaliem os valores
dos imóveis e das transações realizadas com imóveis, o que, no final, pode
significar um aumento da carga de outros impostos”.
Um
exemplo são os contribuintes que fazem operações com valores menores buscando
pagar menos de tributos (ITBI ou ITCMD, por exemplo). De acordo com a
especialista, eles “eventualmente podem ser questionados a partir da avaliação
das informações atualizadas do CIB".
A
LC e a IN não explicitam como será o tratamento dessas informações.
Modernização
e novas rotinas
De
forma geral, a IN vem de uma diretriz estabelecida pela LC para dar maior
transparência nas transações e reduzir fraudes. Trata-se de uma medida
relevante para os proprietários de imóveis, cartórios e mercado imobiliário.
O
cenário exigirá adaptação de sistemas e rotinas dos cartórios e incorporadoras,
além da revisão documental dos imóveis, o que pode gerar custos de
implementação para o setor imobiliário. Os demais contribuintes deverão se
atentar com o preenchimento e entrega de obrigações acessórias.
Tributaristas
consultados pelo JOTA veem o cadastro único como um marco de modernização. De
acordo com a advogada Marcela Adari, do escritório asbz, a criação do CIB
“oferece à Receita Federal uma nova ferramenta para monitorar receitas
provenientes de operações imobiliárias, como vendas e incorporações”. Esses
dados, segundo ela, poderão ser utilizados tanto no IBS e na CBS como no
Imposto de Renda.
A
especialista destaca que “o governo não pretende tributar, pelo IVA-Dual,
pessoas físicas que realizam locações de até R$ 240 mil por ano (limitadas a
três imóveis distintos) nem venda de até três imóveis por ano, observadas
condições”.
“O intuito do fisco também inclui o acesso a dados mais confiáveis para melhor
eficiência na tributação, fiscalização, controle e monitoramento sobre as
operações imobiliárias entre os contribuintes, sobretudo com a instituição da
CBS e do IBS”, afirma Natasha Makiyama.
O
CIB torna mais difícil a sonegação?
De
certa forma, sim. A tendência é de que a centralização dos dados e informações
sobre os imóveis neste novo sistema seja útil para monitoramento aprofundado e
cruzamento com outras bases entre as administrações públicas e autoridades
competentes.
Cronograma
O
cronograma da Receita é de que os resultados e recomendações ao gestor do
sistema nacional de gestão de informações territoriais (Sinter) sejam
apresentados até 20 de dezembro deste ano. Até lá, o grupo de trabalho vai
levantar os sistemas, normativos e práticas atuais dos registros participantes,
desenvolver o piloto para padronização de documentos e fluxos, bem como o
ambiente de homologação.
O
plano de trabalho foi pactuado entre a Secretaria Especial da Receita Federal,
os operadores dos registros públicos e o Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
que passou a acompanhar com mais vigor nos últimos anos a digitalização dos
cartórios extrajudiciais.
2026
é teste
Para
tentar afastar preocupações que surgiram em torno do tema após a circulação de
notícias falsas, a Receita Federal divulgou uma nota na qual reforça que o
sistema estará disponível durante todo o ano de 2026 para testes.
“A
finalidade da CIB é dotar o Brasil de um cadastro imobiliário único, gerando
segurança jurídica para os proprietários, adquirentes e vendedores, relacionado
às operações com imóveis no âmbito do imposto sobre valor agregado – IVA Dual,
a partir de 2027 apenas”, esclarece a nota.
Fonte:
Jota