O Projeto de Lei 7.806/2010, que determina a perda automática da herança nos casos de indignidade, após trânsito em julgado da sentença penal condenatória de herdeiro indigno, foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara dos Deputados.
A proposta tramita em caráter
conclusivo e não foi modificada na Câmara, portanto poderá seguir para sanção
presidencial caso não haja recurso para votação no Plenário.
De autoria da então senadora
Serys Slhessarenko (PT-MS), o PL altera o Código Civil, que atualmente
estabelece que a perda da herança deverá ser declarada em sentença judicial, e
o direito de demandar na Justiça a exclusão do herdeiro ou legatário
extingue-se em quatro anos, contados da abertura da sucessão.
São considerados indignos e
excluídos da herança aqueles que participarem de homicídio doloso, ou
tentativa, contra a pessoa de quem for herdeiro, os que acusaram caluniosamente
em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, e os
que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da
herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.
O novo texto legislativo tem
por objetivo acrescentar o artigo 1.815-A no Código Civil, visando a exclusão
imediata de herdeiro ou legatário indigno após o trânsito em julgado da sentença
penal condenatória. Atualmente, para que isso seja feito, é necessário interpor
ação de indignidade, nos termos do artigo 1.815, cujo prazo decadencial é de
quatro anos, contados da abertura da sucessão.
"O que pretende essa
novidade legislativa é trazer celeridade, economia de tempo e dinheiro nos
processos para os jurisdicionados, pois bastava a condenação criminal,
transitada em julgado, para ocorrer tal exclusão do herdeiro considerado
indigno", afirmou o advogado Rodrigo da Cunha Pereira, presidente do
Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM).
"Devemos partir da
premissa essencial de que a dignidade é um valor intrínseco à pessoa humana. Há
procedimento indigno quando se afronta essa dignidade. Indignidade é um
comportamento, ou uma ação que deteriora ou destrói o outro, agindo diretamente
contra a preservação de sua integridade psicofísica e a preservação de sua
dignidade, desconfigurando a sua essência", explicou.
Condiz com a realidade
social
Para ele, muito mais salutar
que a alteração proposta pelo PL seria propiciar “uma interpretação mais
condizente com a realidade social, no que diz respeito à configuração dos atos
de indignidade”.
"Embora haja quem entenda
como taxativa as previsões do artigo 1.814 Código Civil, homicídio, calúnia e
fraude, para se caracterizar atos de indignidade não se pode assim entendê-la,
sob pena de fetichização da lei", acrescentou o advogado.
"É no encontro, ou
desencontro, do justo e legal, ao se optar pelo justo, a interpretação da lei a
partir da compreensão dos novos institutos jurídicos, das novas concepções e
princípios constitucionais, que fez surgir um novo vocabulário jurídico para o
Direito das Famílias e Sucessões como, por exemplo, alienação parental,
homofobia, violência doméstica, abandono afetivo, certamente caracterizam atos
de indignidade que, no entanto, não estão ali previstos."
Pormenores da proposta
O advogado e professor Rodrigo
Mazzei, membro do IBDFAM, destaca que o PL mantém a ideia de que a indignidade
somente alcança a herança propriamente dita, já que o seu texto, além de se
referir expressamente às figuras do herdeiro e do legatário, faz alusão à regra
voltada à "exclusão de sucessão".
"Tal pormenor é relevante,
pois a interpretação literal do dispositivo proposto no PL pode levar à
conclusão de que não há exclusão do eventual benefício do seguro de morte, uma
vez que o artigo 794 do Código Civil não trata a verba como herança, estando
fora da sucessão causa mortis", disse.
Para ele, a redação impositiva
projetada para o artigo 1.815-A, do Código Civil, pode levar a impressão de que
o trânsito em julgado de ação penal condenatória sempre provocará a exclusão do
indigno da sucessão, não levando em conta a possibilidade do perdão.
"Note-se, ainda, que o
texto proposto não se preocupou com o direito intertemporal, no sentido de
indicar a sua aplicação (ou não) acerca das ações penais já iniciadas antes da
vigência da lei. Como o PL em foco trata de tema de muita relevância deveria,
na minha opinião, ter sido mais cuidadoso, evitando debates quando da entrada
em vigor da lei."
Ponte entre o Processo Penal
e o Processo Civil
O especialista comenta que a
legislação atual contempla norma que, segundo ele, faz a boa interação entre o
Processo Penal e o Processo Civil, "a fim de reconhecer a repercussão
patrimonial de sentença condenatória penal para a constituição de título
executivo judicial (artigo 515, inciso VI, do Código de Processo Civil em
vigor)".
"O PL 7.806/2010 adota
bússola semelhante, fazendo diálogo específico entre o Processo Penal, o
Processo Civil e o Direito Privado, para que a sentença penal condenatória
transitada em julgado seja usada como vetor para a exclusão da sucessão em caso
de indignidade, dispensando a ação autônoma para tanto", afirmou.
Ainda assim, ele acredita que a
proposta poderá ser vista como mais uma peça relevante para que se cogitem
outras comunicações sadias entre o Processo Penal e o Processo Civil na
“concretização de tutela jurídica mais eficiente, sempre respeitando todas as
garantias das partes envolvidas”.
Fonte: ConJur, com informações do IBDFAM.