Em
decisão unânime, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ entendeu
que a alteração do regime de bens do casamento produz efeitos retroativos,
portanto, tem eficácia ex tunc. Para o colegiado, a retroatividade deve ser
admitida se é benéfica para a coletividade, não prejudica terceiros e nem
produz desequilíbrio.
Na
ação, o casal buscava a alteração do regime de bens da sociedade conjugal de
separação total de bens para comunhão universal. O argumento é de que a relação
se consolidou e o patrimônio foi construído em conjunto, motivo pelo qual o
regime não mais atende aos interesses.
A
alteração de regime foi deferida nas instâncias de origem, mas com efeitos ex
nunc, ou seja, com eficácia a partir do trânsito em julgado. O casal recorreu
ao STJ para que a modificação produza efeitos ex tunc e retroaja à data do
casamento, importando na "comunicação de todos os bens presentes e futuros
dos cônjuges e suas dívidas passivas".
Ao
solicitar provimento do recurso especial, o casal alegou violação do artigo
1.667 do Código Civil, bem como divergência jurisprudencial. O pleito foi
atendido pelo relator, o ministro Raul Araújo.
O
ministro considerou que as partes estavam voluntariamente casadas no regime de
separação e, valendo-se da autonomia da vontade, pediram a alteração após anos
de convivência "certamente harmônica e feliz" com o objetivo de
ampliar a união.
De
acordo com o relator, a alteração para comunhão universal dificilmente terá
prejuízo a terceiros, já que o casamento se fortalece com o novo regime adotado
e todos os bens passam a ensejar penhora por eventuais credores. "Não me
parece que se queira adotar o regime universal sem a afetação de todos os bens do
casal.”
"Não
há porque o Estado-juiz criar embaraços à decisão do casal se eles reconhecem
que foi de esforço comum que construíram o patrimônio”, concluiu o magistrado.
Alteração do regime de bens
Para
o juiz Rafael Calmon, membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família –
IBDFAM, o STJ enfrentou e aplicou corretamente o Direito. “A alteração neste
caso específico trouxe mais possibilidades de recuperação de crédito de
eventuais credores.”
Segundo
o magistrado, a mudança de um regime mais restritivo para um mais amplo
“favorece eventuais terceiros que poderiam ser prejudicados de obter patrimônio
para pagar possíveis dívidas do casal”.
Calmon
explica que se esse “terceiro” for credor de uma pessoa casada sob o regime de
separação de bens, deverá escolher qual patrimônio buscar, pois “o patrimônio
não se comunica." Por outro lado, o credor de um casal em regime de
comunhão terá mais opções para saldar a dívida.
O
magistrado aponta a divergência: “O entendimento majoritário era de que os efeitos
não poderiam retroagir. Agora, com esse precedente, inaugura-se uma nova visão
e os efeitos da sentença retroagem sim à data da união”.
Efeito retroativo
No
entendimento do juiz, o efeito retroativo não deve ser possível em toda e
qualquer sentença que modifique o regime de bens. “Apenas quando vem de um
regime mais restritivo originariamente para um mais inclusivo.”
Deste
modo, Calmon entende que a mudança do regime de comunhão de bens para o de
separação total de bens, por exemplo, não pode retroagir à data do casamento.
Ele
explica que o credor pode ter grande possibilidade de receber a dívida de um
casal na comunhão universal, pois o regime permite muita agregação de
patrimônio. Assim, “algumas pessoas podem contrair dívidas com esse casal justamente
por saber dessa garantia na hipótese de inadimplemento”.
“Neste
cenário, retroagir os efeitos da sentença seria como se o casal fosse casado
desde sempre sob regime de separação de bens. Isso causaria surpresa e possível
prejuízo a eventuais terceiros que com eles negociassem”, complementa.
Processo:
REsp 1.671.422
Fonte: IBDFAM