O STJ julgou em 2009 o Tema de
Recurso Repetitivo nº 122, no qual foi fixada a seguinte tese:
"1-Tanto o promitente
comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente
vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis) são
contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU;
2-cabe à legislação
municipal estabelecer o sujeito passivo do IPTU" [1].
O julgamento inclusive deu
origem à Súmula nº 399, abaixo transcrita:
"SÚMULA Nº 399
Cabe à legislação municipal
estabelecer o sujeito passivo do IPTU".
O julgamento, todavia, foi
bastante infeliz, não tendo sido adotada a melhor técnica de Direito
Tributário. Vejamos as razões.
Primeiramente, é imperioso que
se ressalte que, segundo a Constituição, compete à lei complementar estabelecer
normas sobre o fato gerador de impostos e seus respectivos contribuintes.
"CONSTITUIÇÃO FEDERAL
DE 1988
Artigo 146. Cabe à lei complementar:
(...)
III - estabelecer normas
gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...)
a) definição de tributos e
de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta
Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e
contribuintes;".
O problema já começa aí. Se a
Constituição determina que a matéria é reservada à lei complementar, como o STJ
decide que compete à lei municipal dispor sobre o contribuinte do IPTU?
Nem mesmo a alegação de que
supostamente se trataria de responsabilidade tributária de terceiro e não de
sujeição passiva em sentido estrito escapa de uma crítica. Afinal, segundo a
Constituição compete também à lei complementar dispor sobre obrigação
tributária.
"CONSTITUIÇÃO FEDERAL
DE 1988
Artigo 146. Cabe à lei
complementar: (...)
III - estabelecer normas
gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: (...)
b) obrigação, lançamento,
crédito, prescrição e decadência tributários;".
Ou seja, tanto a questão de
quem é contribuinte como a de quem é responsável tributário são matérias
reservadas à lei complementar.
Outro ponto é a alegação de que
o fato do promitente-vendedor não ter comunicado a transferência do imóvel ao
Município seria uma agravante para que ele seja escolhido como responsável
tributário. O problema é que esta é apenas uma obrigação acessória, se o
contribuinte deve ser punido por isso a solução seria aplicar uma multa por
descumprimento de dever instrumental, não torná-lo terceiro responsável
tributário ou contribuinte do IPTU. E, como já foi dito, a lei com status de
complementar que trata do assunto, qual seja, o Código Tributário Nacional,
nada fala sobre tal celeuma, ou seja, não cria tal responsabilidade tributária.
Mais um problema é o fato do
fato gerador do IPTU, como o de qualquer outro imposto, ocorrer uma única vez e
para uma única pessoa. O fato do artigo 34 do CTN prever que o contribuinte do
imposto é o proprietário, o titular do domínio útil, OU o seu possuidor a qualquer
título, não pode ser um afronto a tal afirmação. A lei complementar não poderia
delegar ao Município a competência de dispor sobre contribuinte do IPTU, sob
pena de se estar diante de um vício de constitucionalidade. Deve-se interpretar
o artigo conforme a Constituição. Trata-se, ainda, de pura lógica.
Por fim, o melhor entendimento
é de que o artigo 32 do CTN deve ser interpretado segundo o princípio da
primazia da realidade. Vejamos a redação do artigo:
"LEI Nº 5.172, DE 25 DE
OUTUBRO DE 1966.
Artigo 32. O imposto, de
competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana
tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel
por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na
zona urbana do Município".
Como se percebe, o artigo,
combinado com o artigo 34, pode ser problemático para identificar quem é o
contribuinte do IPTU quando a propriedade, e/ou domínio útil e/ou posse estão
misturados em determinada situação. O correto é interpretar que a posse
prevalece sobre o domínio útil e a propriedade, e o domínio útil prevalece
sobre a propriedade. Só assim resolveríamos o problema de identificar o fato
gerador e contribuinte do IPTU. Prevalece a realidade econômica de cada
situação.
Isto posto, espera-se que o STJ
revise tal jurisprudência, que atualmente é vinculante para os magistrados. Ou,
quem sabe, que o STF venha a discutir a questão formando entendimento
divergente.
[1] STJ. REsp 1111202/SP e REsp
1110551/SP.
Pedro Augusto de Almeida
Mosqueira é advogado.
Fonte: ConJur