Segundo o IBGE, na época da
decisão, a maioria dos casais de pessoas do mesmo sexo era formada por
mulheres.
Em maio de 2011, o Plenário do
Supremo Tribunal Federal (STF), de forma unânime, equiparou as relações entre
pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres, reconhecendo,
assim, a união homoafetiva como um núcleo familiar. A decisão foi tomada no
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e da Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132.
Maioria de mulheres
Um ano antes, no Censo de 2010,
o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) havia identificado 60
mil casais homoafetivos no país, a maioria formada por mulheres (53%). Em 2018,
as Estatísticas de Registro Civil 2018 divulgadas pelo órgão constataram um
aumento de 61,7% na procura pela formalização das uniões em relação ao ano
anterior - e, novamente, o percentual foi maior entre as mulheres (64,2% do
total). Assim, a decisão ajudou a assegurar a elas direitos já garantidos a
todas as mulheres heteroafetivas, como participação em plano de saúde, pensão
alimentícia, divisão de bens e licença-maternidade em caso de adoção ou
reprodução assistida.
União estável
O foco da discussão foi o
artigo 1.723 do Código Civil, que define como união estável aquela "entre
o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e
estabelecida com o objetivo de constituição de família".
Até então, casais homoafetivos
que buscavam a formalização de suas relações podiam obter decisões favoráveis
ou desfavoráveis da Justiça. O entendimento do STF, de natureza vinculante,
afastou qualquer interpretação do dispositivo do Código Civil que impedisse o
reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Em
2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução 175/2013,
determinando que os cartórios realizassem casamentos de casais do mesmo sexo.
Desigualação jurídica
O relator das ações, ministro
Ayres Britto (aposentado), ressaltou, em seu voto, que a Constituição Federal
(artigo 3º, inciso IV) veda qualquer discriminação em razão de sexo, raça, cor
e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de
sua orientação sexual. “O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se
presta para desigualação jurídica”, afirmou.
O ministro assinalou que o
artigo 226 da Constituição garante à família, “base da sociedade”, a proteção
especial do Estado. A seu ver, trata-se da família “em seu coloquial ou
proverbial significado de núcleo doméstico, pouco importando se formal ou
informalmente constituída, ou se integrada por casais heterossexuais ou por
pessoas assumidamente homoafetivas”.
Projeto de felicidade
Para o ministro Luiz Fux,
diversos princípios constitucionais garantem esse direito aos casais do mesmo
sexo, como o da igualdade, da liberdade e da dignidade da pessoa humana.
Segundo ele, o conceito de família só tem validade se privilegiar a dignidade
das pessoas que a compõem, e somente por força da intolerância e do preconceito
se poderia negar esse direito a casais homossexuais.
Fux lembrou, ainda, que a união
homoafetiva é um fato da vida, uma realidade social. “Daremos a esse segmento
mais do que um projeto de vida, um projeto de felicidade”, concluiu.
Longa trilha
Em seu voto, a ministra Cármen
Lúcia afirmou que o julgamento demonstrava que ainda há uma longa trilha para a
conquista de novos direitos. “A violência continua, minorias são violentadas,
discriminações persistem”, afirmou. “Contra todas as formas de preconceito,
contra quem quer que seja, há o direito constitucional. Todas elas merecem
repúdio de todas as pessoas que se comprometam com a justiça, com a democracia,
mais ainda os juízes do Estado Democrático de Direito”.
Patrimônio documental
Em 2018, a decisão do STF
recebeu o certificado MoWBrasil, oferecido pelo Comitê Nacional do Brasil do
Programa Memória do Mundo da Unesco e foi inscrita como patrimônio documental
da humanidade no Registro Nacional do Brasil. O ministro Ayres Britto
representou a Corte em cerimônia realizada no Instituto Histórico-Cultural da
Aeronáutica, no Rio de Janeiro (RJ).
Fonte: STF