Abre-se a possibilidade de os
sócios terem mais opções de regras de sucessão empresarial, permitindo que a
sociedade continue com os sócios remanescentes.
A morte é uma preocupação
inerente a todas as pessoas e, consequente, àqueles que empreendem.
Evidentemente que esta
preocupação permeia o Direito, pois com a morte há a abertura da sucessão e a
herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.
Para o Direito Societário, em
especial na sociedade do tipo limitada, é necessário verificar a destinação das
quotas do sócio falecido.
Pela legislação, no caso de
falecimento de sócio, há possibilidade de (i) as quotas serem liquidadas e o
valor apurado pago aos herdeiros ou (ii) os herdeiros ingressarem na sociedade
e, assim, ser evitada a dissolução parcial.
A regra é que as quotas sejam
liquidadas, sendo que para hipótese de ingressos dos herdeiros, é necessária
previsão no contrato social (art. 1.028, CC).
A dissolução parcial é a solução
jurídica que busca compatibilizar os interesses conflitantes dos sucessores de
sócio morto que não desejam ingressar na sociedade ou de sócio sobrevivente, em
sociedade "de pessoa", que veta o ingresso deles. Mas inexistindo o
conflito de interesses, a sociedade deve permanecer, com a cota do de cujus
transferida a quem o suceder. O falecimento de sócio é causa de dissolução
judicial, se não houver concordância entre as partes quanto à ocorrência de
causa dissolutiva (por exemplo, os sócios supérstites recusarem-se a proceder à
apuração dos haveres), ou extrajudicial, quando houver essa concordância entre
as partes[1].
Cumpre ressaltar que, mesmo com
previsão contratual, os herdeiros do sócio falecido não estão obrigados a
ingressar na sociedade em cumprimento ao princípio constitucional da livre
associação (art. 5º, XX, CF). Diferentemente dos sócios sobreviventes que, por
conta da previsão contratual expressa, não podem se opor ao ingresso dos
herdeiros.
Contudo, caso não ocorra o
ingresso dos herdeiros, seja por ausência de previsão contratual nesse sentido
ou por falta de vontade dos herdeiros, as quotas do sócio falecido serão
liquidadas com o pagamento dos haveres aos herdeiros, cuja data de apuração
será a do óbito (art. 605, I, CPC).
Uma opção muito discutida, era
sobre a possibilidade de alienação automática de quotas de uma sociedade quando
do falecimento de um dos sócios.
Isso porque, em regra, para
arquivamento do contrato social após a morte de sócio, a Junta Comercial exige
a apresentação de alvará judicial permitindo a alienação das quotas do
falecido, ou a escritura de inventário extrajudicial ou do inventário e
partilha, com o intuito de resguardar o patrimônio dos herdeiros, amparando a
exigência na Instrução Normativa 81/20 do Departamento Nacional de Registro
Empresarial e Integração (DREI).
Como dito acima, o art. 1.028 do
Código Civil prevê a liquidação de quota de sócio falecido, mas traz como
exceção, a hipótese de o contrato social dispor de forma diferente. Neste mesmo
sentido é a IN 81/20 do DREI, que no item 4.5 das possibilidades dos sócios
quanto às quotas do sócio falecido, mas traz a ressalva de inaplicabilidade
destas possibilidades no caso de previsão contrária no contrato social.
Diante desta alternativa, o
Departamento Nacional de Registro Empresarial e Integração (DREI) foi instado a
se manifestar em sede recursal (14022.116144/2022-57) de um caso que envolvia a
negativa da Junta Comercial em proceder com o registro da alteração do contrato
social de sociedade, que destinava as quotas do sócio falecido à sócia
remanescente.
O entendimento do órgão julgador
concluiu que o art. 1.028 do Código Civil permite aos sócios dispor sobre
regras específicas em caso de falecimento de sócio, e tal disposição também
está em consonância à Lei de Liberdade Econômica e a autonomia dos sócios em
pactuar seus negócios jurídicos desde que não infrinja as normas de ordem
pública (lei 13.874/19).
Também não é o caso de falar-se
em prejuízo patrimonial aos herdeiros na ordem de sucessão, pois lida-se em
dois aspectos distintos: a transferência automática das quotas que decorre da
livre disposição dos sócios, e a apuração de haveres e pagamento aos herdeiros.
Assim, pelo decido pelo DREI,
abre-se a possibilidade de os sócios terem mais opções de regras de sucessão
empresarial, permitindo que a sociedade continue com os sócios remanescentes e,
ainda, garantindo os direitos patrimoniais dos sucessores.
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[1] COELHO, Fábio Ulhoa. Manual
de Direito Comercial. Direito de Empresa, 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p.
206.
Wagner José Penereiro Armani é sócio do escritório Sartori
Advogados. Doutor em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo. Mestre em Direito Civil pela Universidade Metodista de Piracicaba.
Professor de Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de
Campinas.
Fonte:
Migalhas