Se a ação proposta pelo proprietário visa, de algum modo, a defesa
do direito material, a citação dos réus interrompe o prazo para a aquisição do
imóvel por usucapião. Com esse entendimento, já consolidado na jurisprudência
do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a Quarta Turma não admitiu o recurso
especial de um casal que tentava afastar a interrupção do prazo no âmbito da
discussão sobre a usucapião de terreno no município de Imbé (RS), ocupado desde
1984.
O relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, afirmou que o
acórdão recorrido aplicou a jurisprudência firmada pela Segunda Seção, pois o
proprietário ajuizou uma ação reivindicatória, "o que demonstra claramente
sua intenção de retomar o bem".
De acordo com o magistrado, também é pacífico na Segunda Seção o
entendimento de que a interrupção do prazo ocorre independentemente de a ação
reivindicatória ser declarada ou não procedente, bastando que se evidencie o
inequívoco exercício do direito e a boa-fé do autor.
Disputa antiga
A disputa surgiu porque o casal de possuidores do imóvel teria
negociado a compra apenas com a esposa do proprietário, que era analfabeta.
Alegando que o valor foi pago integralmente, mas que a escritura definitiva não
foi outorgada, os possuidores ingressaram com ação de adjudicação compulsória
e, depois, com ação de usucapião ordinária – ambas julgadas improcedentes em primeira
e segunda instâncias.
Posteriormente, no ano 2000, o espólio dos proprietários ajuizou
ação reivindicatória, na qual os possuidores foram citados, mas o processo foi
extinto em primeiro grau, sem julgamento de mérito.
Os herdeiros protocolaram outra ação e conseguiram sentença
favorável para a imissão na posse, mas com a determinação de indenizar as
benfeitorias feitas até 1996 – data em que o espólio contestou a ação de
adjudicação compulsória.
Para o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), além de a
usucapião ordinária ter sido afastada em decisão já transitada em julgado,
tampouco havia direito dos possuidores à usucapião extraordinária, pois a
citação na ação reivindicatória de 2000 interrompeu o prazo de 20 anos de posse
mansa e pacífica exigido pelo Código Civil de 1916.
Benfeitorias
Diante da decisão do TJRS sobre o marco interruptivo do prazo da
usucapião, foram opostos embargos de declaração requerendo a alteração da data
instituída para aferir a boa-fé das benfeitorias indenizáveis. Rejeitado o
pedido, os possuidores interpuseram recurso no STJ, o qual foi provido para
determinar à corte de origem que resolvesse a apontada contradição.
Ao analisar a matéria, o TJRS afirmou que a fixação do marco
interruptivo da usucapião em 2000 não interfere no período indicado na sentença
para a indenização das benfeitorias, uma vez que a boa-fé dos possuidores
desapareceu a partir da contestação do espólio na ação de adjudicação
compulsória, em 1996 – "ainda que tal contestação não tivesse o condão de
interromper o prazo para usucapião".
Inconformado, o casal apresentou novo recurso especial, inadmitido
na origem. O juízo negativo quanto à admissibilidade foi mantido pelo ministro
Luis Felipe Salomão. Segundo ele, além de o acórdão do TJRS estar em conformidade
com a jurisprudência do STJ, as conclusões da corte estadual sobre a não
caracterização da usucapião não podem ser revistas em recurso especial, pois
isso exigiria o reexame de provas – o que é vedado pela Súmula 7.
O relator observou ainda que a jurisprudência considera que a
perda da condição de boa-fé, para fins de cálculo da indenização por
benfeitorias, depende de que as circunstâncias façam presumir que o possuidor
não ignora que possui indevidamente, como previsto no Código Civil. No entanto,
para o ministro, apreciar essas circunstâncias também exigiria novo exame das
provas do processo.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): AREsp 1542609
Fonte: STJ