O presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei 14.118, de 2021, que cria o Programa Casa Verde e
Amarela, substituto do Minha Casa, Minha Vida. Além do financiamento
habitacional, o novo plano inclui regularização fundiária e crédito para
reformas. A norma é resultado da medida provisória (MP) 996/2020, aprovada pelo Senado em dezembro. O texto
foi publicado no Diário Oficial da União desta quarta-feira (13).
Bolsonaro vetou apenas um artigo do projeto de lei de
conversão. O dispositivo permitia que construtoras contratadas pelo Programa
Casa Verde e Amarela para erguer casas no valor de até R$ 124 mil pagassem
tributos equivalentes a 4% da receita mensal. A alíquota unificaria o Imposto
de Renda da Pessoa Jurídica, os Programas de Integração Social e de Formação do
Patrimônio do Servidor Público (PIS/Pasep), a Contribuição Social sobre o Lucro
Líquido (CSLL) e a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social
(Cofins).
Com o veto, o benefício permanece valendo apenas para
empresas contratadas pelo antigo Minha Casa, Minha Vida e com obras já
iniciadas. De acordo com o presidente da República, “apesar de meritória”, a
proposição não apresenta a estimativa de impacto orçamentário e as medidas
compensatórias, o que viola a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei
Complementar 101, de 2000).
Além disso, segundo Bolsonaro, a unificação de tributos
descumpre a Lei de Diretrizes Orçamentárias (Lei 14.116, de 2020). Ela estabelece que o prazo de
vigência de benefício fiscal deve conter cláusula de, no máximo, cinco anos.
O Casa Verde e Amarela alcança famílias com renda mensal de
até R$ 7 mil, em áreas urbanas, e renda anual de até R$ 84 mil, em áreas
rurais. O programa divide o público-alvo em três faixas de renda familiar: até
R$ 2 mil mensais, de R$ 2 mil a R$ 4 mil, e de R$ 4 mil a R$ 7 mil. Somente
aqueles com renda até R$ 4 mil em área urbana ou com renda anual de até R$ 48 mil
em área rural poderão contar com subvenção da União para adequar as parcelas ao
orçamento familiar. Os valores recebidos temporariamente — como o auxílio
emergencial — não entram no cálculo da renda.
As taxas de juros serão diferentes para as regiões do país:
no Norte e no Nordeste elas ficam entre 4,25% e 4,5% ao ano, a depender da
faixa de renda familiar, enquanto no restante do país serão de 5%.
Um regulamento do Poder Executivo ainda vai definir os
critérios de seleção dos beneficiários, as regras de preferência aplicáveis a
famílias em situação de risco ou vulnerabilidade, que tenham a mulher como
responsável pela unidade familiar ou de que façam parte pessoas com deficiência
ou idosos. O regulamento também vai incluir critérios para selecionar entidades
privadas sem fins lucrativos, micros e pequenas empresas locais e
microempreendedores individuais (MEI) de construção para atuarem no programa.
Reaproveitamento
Os contratos referentes ao Minha Casa, Minha Vida, criado em
2009, continuam regidos pelas regras originais, mesmo aqueles assinados depois
da edição da MP 996/2020. O Casa Verde e Amarela permite a transferência de
imóveis construídos pelo Minha Casa, Minha Vida e retomados por falta de
pagamento. Essas unidades habitacionais serão destinadas à compra por outro
beneficiário a ser indicado “conforme as políticas habitacionais e normas
vigentes”.
Outra hipótese é a doação aos estados e municípios, se eles
pagarem a dívida para que a família devedora permaneça no imóvel ou para serem
destinados a outros programas de interesse social. Já as moradias sem condições
de serem habitadas poderão ser vendidas conforme definir o regulamento. A
prioridade será para uso em programas habitacionais e para pessoas que cumpram
os requisitos do programa habitacional.
As unidades habitacionais produzidas no âmbito do programa
poderão ser vendidas aos beneficiários, com financiamento subsidiado ou não, ou
mesmo cedidas, doadas ou alugadas, conforme regulamento. Essa subvenção poderá
ser acumulada com os descontos concedidos nas operações com recursos do Fundo
de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e com outras concedidas por programas
habitacionais estaduais, distrital ou municipais.
Na regularização fundiária, as subvenções com dinheiro do
Orçamento da União poderão beneficiar somente famílias de baixa renda em
núcleos informais urbanos assim declarados pela prefeitura da localidade.
Contrapartidas
Quando a União destinar um terreno a entes privados no
âmbito do programa, as contrapartidas serão definidas pelo Ministério do
Desenvolvimento Regional (MDR) e poderão ser, por exemplo, criação de
infraestrutura urbana para atender a área do imóvel e suas imediações,
prestação de serviços relacionados aos imóveis que deverão ser construídos no
local ou transferência direta das unidades aos beneficiários.
Após cumprir as contrapartidas, o empreendedor terá
liberdade para explorar economicamente a parte do imóvel não vinculada a elas.
Assim, um terreno grande poderá ser dividido para que uma parte seja destinada
à construção de moradias para o programa e outra parte fique com a empresa, que
poderá vender outras unidades produzidas.
O valor das contrapartidas deverá ser igual, no mínimo, ao
valor do terreno avaliado antes de o município alterar o ordenamento jurídico
para viabilizar seu uso para essa finalidade. Esse seria o caso de mudança de
destinação de um setor da cidade de industrial para residencial, por exemplo.
Durante o tempo estipulado para a realização das
contrapartidas, o empreendedor deverá prestar garantia de até 30% do valor do
terreno. A verificação do cumprimento das obras poderá ser feita também por
órgãos estaduais ou municipais por delegação.
Nova chance para empresas
A Lei 14.118, de 2021 concede uma segunda chance para as
empresas que não entregaram moradias contratadas no programa Minha Casa, Minha
Vida terminarem o empreendimento sem cobrança da dívida gerada por estourarem
os prazos de entrega. Essas empresas terão mais um máximo de 30 meses para
concluir as obras sem aumento de custos para a União, podendo contar com ajuda
financeira do estado ou do município em conjunto com algum agente financeiro,
como banco ou financiadora imobiliária.
Entretanto, ao manifestar o interesse pela conclusão das
obras, o texto permite a declaração de quais unidades habitacionais têm
“viabilidade de execução para conclusão e entrega”, abrindo a possibilidade de
se entregar menos imóveis que o financiamento original previa. Parcelas
pendentes de liberação retidas por descumprimento do contrato original
dependerão da conclusão das obras, sem adiantamentos.
Saneamento e urbanização
O Casa Verde e Amarela usará recursos orçamentários da
União, do FGTS e de outros três fundos criados para financiar programas
habitacionais de governos passados: de arrendamento residencial (FAR), de
desenvolvimento social (FDS) e de habitação de interesse social (FNHIS).
Respeitados os regulamentos de cada fundo, o Casa Verde e
Amarela poderá financiar ainda estudos e projetos urbanísticos, habitacionais e
paisagísticos; obras de saneamento e infraestrutura, se associadas às
habitações construídas pelo programa; assistência técnica para melhoria de
moradias; compra de bens para apoiar agentes públicos e privados envolvidos na
implementação do programa; produção de unidades de uso comercial, se associadas
às habitacionais; e seguro.
Os projetos e as obras deverão dar preferência ao uso de
materiais de construção oriundos de reciclagem, como tijolos feitos com
rejeitos de mineração, e prever condições de acessibilidade para pessoas com
deficiência ou idosos.
Estados e municípios
Em obras produzidas com recursos do FAR ou do FDS, governos
estaduais e municipais que aderirem ao programa deverão arcar com os custos de
infraestrutura básica como pavimentação de ruas, escoamento das águas pluviais
e redes de água, esgoto e energia.
Estados, municípios e Distrito Federal poderão também entrar
com o terreno e obras para complementar o empreendimento ou mesmo assumir o
valor da operação. Serão aceitos incentivos e benefícios de natureza
financeira, tributária ou creditícia, como redução de tributos para diminuir o
custo final.
Outra condição para a participação dos entes da federação no
programa é a aprovação e publicação de lei de isenção do tributo de
transferência do imóvel (ITBI) nesses casos. O tributo é normalmente pago pelo
comprador.
Para as contratações realizadas até 31 de dezembro de 2021,
a lei deve produzir efeitos antes da entrega das unidades habitacionais às
famílias beneficiadas.
Proibições
De acordo com Lei 14.118, de 2021, não poderão receber ajuda
para a compra do imóvel no âmbito do programa quem já tenha contrato de
financiamento com recursos do FGTS ou em condições equivalentes do Sistema
Financeiro de Habitação (SFH), quem já tenha imóvel regular com infraestrutura
urbana e padrão mínimo de edificação, ou quem tenha recebido benefícios
similares nos últimos dez anos com recursos dos fundos participantes.
Essa proibição não se aplica, entretanto, ao atendimento de
famílias com obras e serviços de melhoria habitacional, nem de famílias envolvidas
em situações de reassentamento, remanejamento ou substituição de moradias
(encostas, por exemplo), ou desabrigadas que tenham perdido seu único imóvel em
razão de situação de emergência ou estado de calamidade pública reconhecidos
pela União. Podem participar ainda as pessoas que tenham propriedade de imóvel
residencial em fração de até 40%, ainda que seja por herança ou doação.
Mulher
Em famílias com casais de sexos diferentes, tanto o contrato
quanto o registro do imóvel serão feitos, preferencialmente, em nome da mulher.
Se ela for chefe de família, não precisará da concordância do marido ou
companheiro. Prejuízos sofridos em razão da regra deverão ser resolvidos em
causas de perdas e danos.
No caso de divórcio, a propriedade do imóvel comprado ou
regularizado pelo programa durante o casamento ou união estável ficará com a
mulher, independentemente do regime de bens (comunhão parcial ou total ou
separação total de bens).
A exceção é para operações financiadas com recursos do FGTS
e quando a guarda dos filhos for exclusiva do homem. Nessa última situação, o
imóvel será registrado em seu nome ou transferido a ele.
Retomada
Tanto no programa habitacional Minha Casa, Minha Vida quanto
no Casa Verde e Amarela, a Lei 14.118, de 2021, inclui dispositivo para
permitir o emprego de “atos de defesa”, inclusive com ajuda da polícia, para
garantir a posse de imóveis ainda não vendidos aos beneficiários finais, mas
ocupados por outros moradores. O uso da polícia pode ser previsto em
instrumentos firmados entre a União e estados ou municípios.
Cartório
As famílias de baixa renda beneficiadas com as unidades
construídas contarão com isenção no pagamento de taxas de escritura e registro
dos imóveis, como previsto na Lei 11.977, de 2009, que criou o Minha Casa, Minha Vida.
O Casa Verde Amarela prevê que os fundos estaduais usados
para compensar os cartórios pelo serviço gratuito poderão receber recursos de
fundos federais de habitação sem necessidade de acordo, contrato ou qualquer
outro instrumento.
Para isso, conselhos estaduais de habitação terão a
responsabilidade de fiscalizar a aplicação desses recursos; os estados devem
contribuir com o fundo e encaminhar prestação de contas ao controle interno do
Poder Executivo federal e ao Tribunal de Contas da União (TCU).
Já o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI),
criado pela Lei 13.465, de 2017, será financiado por um fundo criado
pela nova lei. Esse sistema de registro pretende conectar todos os cartórios de
imóveis do país, facilitando o acesso a consultas e serviços on-line. O fundo
contará com recursos de todos os cartórios de imóveis por meio de contribuições
a serem definidas pelo operador nacional do SREI.
Consulta pública
Para elaborar o Plano Nacional de Habitação de Interesse
Social, o Ministério do Desenvolvimento Regional foi dispensado de ouvir o
Conselho das Cidades, bastando consulta pública. Decisão do Supremo Tribunal
Federal (STF) impediu a extinção do conselho por decreto de Jair Bolsonaro.
Loteamentos
A Lei 14.118, de 2021, incluiu na Lei dos Loteamentos
Urbanos (Lei 6.766, de 1979), novos agentes que podem ser
considerados empreendedores responsáveis por parcelamentos do solo, como o
próprio proprietário do imóvel a ser parcelado, a administração pública que
fizer desapropriação, cooperativa ou associação de moradores ou empresa
contratada para executar o parcelamento.
O texto também altera a lei para permitir a prorrogação, por
igual período, do prazo de quatro anos que o loteador tem para realizar obras
básicas na área do loteamento, como as ruas, a demarcação dos lotes, quadras e
obras de escoamento das águas pluviais.
Fonte: Senado