2020, sem sombra de dúvidas, foi um ano histórico, marcado
pelos devastadores e inesperados efeitos da pandemia do COVID-19, cujo combate
exigiu uma mobilização em todos os níveis institucionais e setores da
sociedade. As repercussões geradas pela pandemia são incontáveis e, como não
poderia deixar de ser, alcançaram inclusive o universo jurídico.
Pode-se afirmar que um dos principais efeitos colaterais da
pandemia, na práxis jurídica, foi um salto significativo no processo de
migração para os sistemas informatizados. É claro que esse movimento já se
verificava há muito tempo, mas o isolamento imposto pela pandemia demandou
medidas drásticas, que não podiam esperar o ritmo natural do processo de
informatização.
Diversas tarefas e procedimentos que se realizavam
pessoalmente passaram a ser realizados de forma virtual. Em alguns casos, essas
medidas exsurgiram como soluções temporárias, mas, em outros, as mudanças estão
se consolidando como definitivas.
No âmbito extrajudicial, foram editados diversos provimentos
pela Corregedoria Nacional de Justiça, com o objetivo de criar alternativas ao
tradicional atendimento presencial nas serventias e, assim, reduzir os riscos
de contágio sem comprometer a continuidade dos serviços durante o período de
quarentena.
O primeiro ato normativo expedido pela Corregedoria Nacional
de Justiça, com esse objetivo, foi o Provimento 91, de 22 de março de 2020, que
determinou a suspensão ou redução do atendimento ao público, além da suspensão
do funcionamento das serventias extrajudiciais, além de regular a suspensão de
prazos para a lavratura de atos notariais e de registro.
Em seguida, foi editado o Provimento 93, de 26 de março, que
regulou o funcionamento dos registros públicos de nascimento e óbito durante o
período de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN).
No que diz respeito ao Registro de Imóveis, a Corregedoria
Nacional de Justiça editou o Provimento 94, de 28 de março de 2020, regulando
seu funcionamento pelo sistema de plantão (presencial ou à distância) nas
localidades em que foi decretada a quarentena.
Em 1º de abril de 2020, a edição do Provimento 95 trouxe
novas regras sobre o funcionamento das serventias extrajudiciais durante a
pandemia. No dia 27 do mesmo mês, a Corregedoria Nacional de Justiça editou o
Provimento 97, regulamentando os procedimentos de intimação nos Tabelionatos de
Protesto do país; bem como o Provimento 98, dispondo sobre o pagamento dos
emolumentos, acréscimos, dívidas e demais despesas por meios eletrônicos, nas
serventias extrajudiciais, durante a pandemia.
Com o passar dos meses e o avanço implacável do vírus, as
medidas mencionadas foram objeto de sucessivas prorrogações (Provimentos 96,
99, 101 e 105). Na última dessas prorrogações, os Provimentos 91, 93, 94, 95,
97 e 98 tiveram sua vigência estendida para o dia 31 de dezembro de 2020, pelo
Provimento nº 105.
O que se nota é que, além dos atos normativos voltados
diretamente a instituir medidas de combate à disseminação do COVID-19 - que
envolvem o recurso à informática e ao trabalho remoto, como visto - o CNJ
também normatizou assuntos que, embora não diretamente referentes à pandemia,
também se relacionam com o avanço da informatização e da implementação de
alternativas digitais aos tradicionais procedimentos físicos.
Nessa linha, o Provimento nº 100, de 26 de maio de 2020,
dispôs sobre a prática de atos notariais eletrônicos utilizando o sistema
e-Notariado, além de criar a Matrícula Notarial Eletrônica-MNE e dar outras
providências. Em seguida, foi editado o Provimento nº 103, de 04 de junho de
2020, dispondo sobre a Autorização Eletrônica de Viagem nacional e
internacional de crianças e adolescentes até 16 anos desacompanhados de ambos
ou um de seus pais.
Levando em consideração o papel de Ofício da Cidadania
exercido pelos RCPN, e colocando em benefício da população os progressos
derivados da informatização dos serviços notariais e registrais, a Corregedoria
Nacional de Justiça editou o Provimento nº 104/2020, dispondo sobre o envio de
dados registrais, das pessoas em estado de vulnerabilidade socioeconômica, pelo
RCPN aos Institutos de Identificação dos Estados e do Distrito Federal, para
fins exclusivos de emissão de registro geral de identidade. Essa emissão pode
ser feita diretamente ou por intermédio da Central de Informações de Registro
Civil de Pessoas Naturais- CRC, e se alinha ao compromisso assumido em nível
nacional para a ampliação do acesso do cidadão brasileiro à documentação civil
básica, mediante colaboração e articulação dos entes públicos (art. 1º do Decreto
n. 6.289, de 6 de dezembro de 2007).
Dando continuidade ao propósito de impulsionar a
informatização em nível nacional, a Corregedoria Nacional de Justiça editou o
Provimento nº 106, de 17 de junho de 2020, dispondo sobre a adoção e utilização
do sistema eletrônico "APOSTIL" para a confecção, consulta e gestão
de apostilamentos em documentos públicos, realizados em todas as serventias
extrajudiciais do país.
Já por meio do Provimento 107, de 24 de junho de 2020, a
Corregedoria Nacional de Justiça esclareceu ser vedada a cobrança de quaisquer
valores dos consumidores finais dos serviços prestados pelas centrais
cartorárias em todo o território nacional.
Seguindo essa linha, a Corregedoria Nacional de Justiça deu
também mais um passo na implementação do sistema de registro de imóveis
eletrônico, ao disciplinar, por meio do Provimento nº 109, de 14 de outubro de
2020, a sua atuação como Agente Regulador do ONR - Operador Nacional do
Registro Imobiliário Eletrônico. O ato normativo tem por objetivo disciplinar a
forma de funcionamento do Agente Regulador para que se estabeleçam os meios de
interação entre ele e o ONR, bem como para definir como se dará a atividade de
regulação própria do Poder Judiciário que decorre de sua atividade
fiscalizatória dos serviços prestados pelos órgãos incumbidos dos serviços
delegados de notas e registro.
Em nível legislativo, um dos mais importantes acontecimentos
do ano foi a entrada em vigor da Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018,
denominada Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), que dispôs sobre o
tratamento de dados pessoais, inclusive nos meios digitais, por pessoa natural
ou por pessoa jurídica de direito público ou privado, com o objetivo de
proteger os direitos fundamentais de liberdade e de privacidade e o livre
desenvolvimento da personalidade da pessoa natural.
Observe-se que, muito embora a LGPD tenha entrado em vigor
no dia 18 de setembro de 2020, os dispositivos que tratam das sanções
administrativas impostas àqueles que violam seus preceitos (arts. 52, 53 e 54)
apenas entrarão em vigor em 1º de agosto de 2021.
Não se pode negar que 2020 foi recheado de surpresas, o que
deixa incertezas quanto ao que nos reserva 2021. De nossa parte, podemos prever
que no ano vindouro estaremos mais presentes aqui no Portal Migalhas, agora que
retomamos com muito carinho nossa coluna quinzenal.
Fiquem conosco e sejam felizes!
Até o próximo Registralhas.
Fonte: Migalhas