Os Cartórios de Notas do Rio Grande do Sul registraram um
aumento de 39% na formalização de uniões estáveis durante a pandemia de
coronavírus. Os reconhecimentos das uniões no Estado passaram de 1.183 em maio
para 1.650 em agosto. Especialistas acreditam que a pandemia fortaleceu
relacionamentos e fez com que os casais passassem a pensar no planejamento
familiar, incluindo a instrumentalização da união estável nos planos.
Um relacionamento pode ser caracterizado como união estável
quando há continuidade, certa durabilidade e objetivo de construir família.
"A união estável não nasce só a partir de um documento, como é o
casamento. Ela nasce a partir de um relacionamento. As pessoas vão namorando e,
quando se dão conta, já estão em união estável", explica o presidente do
Instituto Brasileiro de Direito de Família (Ibdfam-RS), Braulio Dinarte da
Silva Pinto. O advogado conta, também, que muitos casais, após o término do relacionamento,
discutem se viviam em um namoro ou união estável.
A diferença entre namoro e união estável não é perceptível.
"Basta começar a se relacionar com intensidade e com projeto de família
que já estará em união estável", acrescenta Pinto. De acordo com ele, o
número de casais em união estável no Brasil é muito maior do que aquele que
consta nos registros. Ter esse documento ou não, porém, não faz diferença.
"Não ter a união estável registrada ou um documento que
comprove não representa nenhum tipo de problema. A pessoa que não tiver esse
registro só vai ter um custo maior caso um dia precise declarar ou comprovar
essa união", afirma Claudia Barbedo, advogada especialista em Direito de
Família. Ela explica que, se o companheiro morrer, essa pessoa sem registro da
união estável terá que fazer uma declaração judicial e provar para um juiz que
essa união existiu. "Então vai ter o custo e a demora de um processo, ao
passo que a escritura pública da união estável pode ser feita em um
tabelionato."
Para a tabeliã do 7º Tabelionato de Notas de Porto Alegre,
Rita Bervig, um dos motivos de o número ter aumentado durante a pandemia também
é uma das razões desse documento ser importante, que é a questão de
instrumentalização do regime de bens. "Tudo aumentou durante a pandemia:
divórcio, inventário e união estável. Mas, nesse caso, sentimos o desejo dos
casais de instrumentalizar o regime. Se não há instrumentalização na união, o
que vigora é o que consta na lei, que é a comunhão parcial de bens."
Ela acredita que não aumentaram o número de relacionamentos
novos, mas sim o desejo de cuidar do planejamento patrimonial daqueles casais
que já estavam juntos antes da pandemia, mesmo que por pouco tempo. Já Pinto
defende que a pandemia fez com que esses casais de passassem a dividir a vida
de forma mais intensa, optando por morar juntos, por exemplo. Ainda que a lei
não exija que o casal more sob o mesmo teto para caracterizar união estável, os
especialistas acreditam que o isolamento social, a crise e o desemprego
possibilitaram que alguns casais tomassem essa decisão.
Claudia acredita que esse aumento de 39% já era esperado
para a situação em que vivemos. "Com a ameaça de morte ou doença trazida
pelo novo coronavírus, as pessoas se preocuparam mais com a organização e o
planejamento familiar. Dentro disso está a declaração da união estável, que é
um dos instrumentos para esse planejamento", defende a advogada.
A tabeliã, porém, ficou um pouco surpresa com a quantidade
de escrituras públicas de união estável e acredita que, após a pandemia, o
número deve voltar aos patamares anteriores. "Acho que vai diminuir um
pouco. As pessoas estão muito juntas agora, então alguns acontecimentos da
pandemia fizeram com que muitos casais repensassem suas relações e
interesses. Assim como as mortes por Covid-19 fizeram as pessoas
refletirem a respeito do planejamento sucessório, por exemplo",
complementa Rita.
Ainda que o número tenha sido esperado por alguns e
surpreendido outros, o aumento registrado no Rio Grande do Sul é baixo dentro
do cenário nacional. Entre as unidades da federação com maior destaque no
aumento de uniões estáveis entre maio e agosto estão Ceará (124%), Roraima
(100%), Acre (85%), Distrito Federal (72%), Espírito Santo (60%), Bahia (55%),
Alagoas (54%), São Paulo (52%), Maranhão (50%) e Pernambuco (43%). O Rio Grande
do Sul aparece logo em seguida com 39%.
Fonte: Jornal do Comércio