Ninguém se casa pensando em separação. Salvo nas hipóteses
em que o casal define previamente o regime de bens em um contrato – o chamado
pacto antenupcial –, as relações conjugais normalmente não começam com uma
discussão clara e precisa sobre o patrimônio comum que será formado e sua
futura destinação.
A extinção da sociedade conjugal traz a necessidade de fazer
a partilha, etapa frequentemente dolorosa – especialmente no regime de comunhão
parcial de bens, em que tudo o que é conquistado durante a convivência pertence
a ambos, mas aquilo que cada um já tinha antes da união continuou sendo o
patrimônio particular de cada um.
Esse regime é o que prevalece quando o casal não define
outro no pacto antenupcial, ou quando o regime eleito é declarado nulo por
qualquer motivo.
Na hora da separação, o conhecimento das regras aplicáveis a
cada regime patrimonial nem sempre basta para evitar conflitos sobre o que
entra ou não entra na divisão. A jurisprudência dos colegiados de direito
privado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) cobre uma enorme variação de
aspectos nessa eterna discussão sobre "o que é meu, o que é seu" –
ou, em linguagem jurídica, sobre o que se comunica ou não no regime da comunhão
parcial.
Legis??lação
Os artigos 1.658, 1.659 e 1.660 do Código
Civil de 2002 (CC/2002) descrevem os bens sujeitos à partilha na comunhão
parcial.
Segundo o Código Civil, quando aplicável o regime da
comunhão parcial, comunicam-se todos os bens que sobrevierem ao casal, na
constância da união (artigo 1.658), excetuando-se, porém, os bens que
cada cônjuge possuir ao se casar e os adquiridos individualmente – por exemplo,
mediante doação (artigo 1.659).
Já o artigo 1.660 estabelece que entram na comunhão
os bens adquiridos na constância do casamento por título oneroso, ainda que só
em nome de um dos cônjuges, e também os que forem adquiridos por fato eventual,
com ou sem o concurso de trabalho ou despesa anterior.
Em julgamento de 2016, o ministro Luis Felipe Salomão
explicou que, na sociedade conjugal, os bens adquiridos durante o casamento são
de propriedade exclusiva do cônjuge que os adquiriu, e assim seguirá enquanto
perdurar o matrimônio.
No entanto, após a dissolução do casamento, qualquer dos
cônjuges tem o direito à meação, e este é um efeito imediato, segundo o
ministro, de requerer a partilha dos bens comuns, sobre os quais tinha apenas
uma expectativa de direito durante o desenrolar do matrimônio.
"Em regra, o regime da comunhão parcial de bens conduz
à comunicabilidade dos adquiridos onerosamente na constância do casamento,
ficando excluídos da comunhão aqueles que cada cônjuge possuía ao tempo do
enlace, ou os que lhe sobrevierem na constância dele por doação, sucessão ou
sub-rogação de bens particulares", destacou o ministro.
Salomão acrescentou que tal entendimento é exatamente o que
se depreende do artigo 1.658 do CC/2002: "No regime de comunhão parcial,
comunicam-se os bens que sobrevierem ao casal, na constância do casamento, com
as exceções dos artigos seguintes".
Para o ministro, esse artigo exterioriza exatamente o
princípio segundo o qual são comuns os bens adquiridos durante o casamento, a
título oneroso, tendo em vista a aquisição por cooperação dos cônjuges.
"Assim, excluem-se aqueles levados por qualquer dos
cônjuges para o casamento e os adquiridos a título gratuito, além de certas
obrigações", acrescentou, destacando que a enumeração das situações está
no artigo 1.659 do CC/2002.
Verbas trabalhistas
Para o STJ, as indenizações referentes a verbas trabalhistas
nascidas e pleiteadas na constância do casamento comunicam-se entre os cônjuges
e integram a partilha de bens.
Seguindo o entendimento firmado na jurisprudência da corte,
a Terceira Turma confirmou acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso que
consignou que os créditos adquiridos na constância do casamento – ainda que
decorrentes do trabalho pessoal de um dos cônjuges – são partilháveis com a
decretação do divórcio.
No caso julgado, as verbas trabalhistas originaram-se de
precatório no valor de quase R$ 1 milhão, e o tribunal entendeu que o crédito
trabalhista foi gerado durante o período da constância do casamento; por isso,
integraria o conjunto de bens adquiridos durante a união matrimonial, sendo
passível de partilha.
"A orientação firmada nesta corte é no sentido de que,
nos regimes de comunhão parcial ou universal de bens, comunicam-se as verbas
trabalhistas correspondentes a direitos adquiridos na constância do casamento,
devendo ser partilhadas quando da separação do casal", destacou o ministro
Moura Ribeiro, relator do caso.
Crédito previdenciário
O crédito previdenciário decorrente de aposentadoria pela
previdência pública, ainda que tenha sido recebido apenas após o divórcio, também
integra o patrimônio comum a ser partilhado, nos limites dos valores
correspondentes ao período em que o casal ainda permanecia em matrimônio sob o
regime da comunhão parcial de bens.
Fonte: Superior Tribunal de Justiça