Para alienar ou gravar de ônus real imóveis adquiridos na
constância da união estável, é indispensável a autorização do companheiro –
condição de eficácia do negócio ou da garantia –, ressalvada a hipótese do
terceiro de boa-fé que não tinha conhecimento do vínculo entre os conviventes.
Com base nesse entendimento, a maioria da Terceira Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou acórdão do Tribunal de Justiça do
Rio Grande do Sul (TJRS) que afastou a alienação fiduciária da parte de imóvel
residencial pertencente à ex-companheira do devedor, em razão de não ter havido
autorização sua para a prestação da garantia.
No processo, ficou comprovado que a empresa credora – que
firmou o contrato de financiamento com o ex-companheiro – sabia da existência
da união estável.
Apesar desse quadro, como forma de evitar o enriquecimento
ilícito da ex-companheira (que recebeu o imóvel integralmente no momento da
dissolução da união), o TJRS consolidou a propriedade em favor da credora,
mantendo a garantia fiduciária sobre a parte do imóvel que pertencia ao
companheiro, mas garantindo à ex-companheira o direito de meação do bem
alienado.
Nos recursos apresentados ao STJ, tanto a empresa quanto a
ex-companheira contestaram a decisão do tribunal gaúcho.
Segundo a mulher, a empresa que firmou o contrato teria ciência
inequívoca da existência da união estável e, assim, não poderia ter dispensado
a autorização convivencial, razão pela qual a ineficácia da garantia seria
integral, e não de apenas 50%.
A empresa pediu ao STJ o reconhecimento integral da garantia
e a consolidação total da propriedade em seu nome.
Invalidade
A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que, para a
jurisprudência do STJ, em geral, é indispensável a autorização de ambos os
conviventes quando se pretender alienar ou gravar de ônus real bens imóveis
adquiridos durante a união estável (artigo 226, parágrafo 3º, da Constituição Federal e
Leis 8.971/1994 e 9.278/1996),
sob pena de absoluta invalidade do negócio jurídico.
Todavia, destacou a relatora, a regra não se aplica na
hipótese do terceiro de boa-fé que não tinha (nem poderia ter) ciência da união
estável, caso em que o negócio jurídico celebrado por um dos companheiros
deverá ser considerado inteiramente válido, cabendo ao outro o ajuizamento de
ação por perdas e danos.
No caso em julgamento, porém, a ministra destacou que
"não se cogita de boa ou de má-fé das partes ou do terceiro, mas, ao
revés, de desídia e de negligência da credora fiduciária", pois a empresa
– frisou a relatora – estava ciente da união estável e "não se acautelou e
não exigiu a autorização de ambos os conviventes antes da celebração do
negócio".
Por outro lado, esclareceu Nancy Andrighi, também ocorreu
enriquecimento sem causa da ex-convivente do devedor fiduciante, que tinha
ciência das tratativas havidas entre o companheiro e a credora, e que recebeu o
imóvel, de forma integral, por ocasião da partilha de bens na dissolução da
união estável.
Por isso, afirmou a ministra, é necessária uma solução
distinta, "no sentido de consolidar integralmente a propriedade do imóvel
em favor da credora, mas resguardar a meação da ex-convivente que não anuiu com
o negócio jurídico, a quem caberá a metade do produto da alienação do bem"
– tal como decidido em segunda instância.
Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1663440