1.
Contexto do problema.
Por
vezes o fisco municipal tem autuado os notários e registradores paulistas,
mediante lançamento complementar e imposição de multa, arbitrando-se a base de
cálculo dos serviços prestados como sendo de 62,5% dos valores declarados ao
CNJ.
O
cerne da questão é a não aceitação dos valores declarados pelo contribuinte na
documentação fiscal quando o recolhimento do ISSQN for inferior a 62,5% dos
valores por ele declarados ao CNJ.
2.
Natureza jurídica da imposição da base de cálculo como sendo de 62,5% dos
valores declarados ao CNJ.
O
ISSQN é imposto que incide sobre a prestação de serviços e sua base de cálculo
está prevista na LC 116, de 31/7/2003, em seu art. 7º:
"Art.
7º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço."
O
CTN, por sua vez, impôs a forma do lançamento do ISSQN em seu art. 147:
"Art.
147. O lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito passivo ou de
terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributária, presta à
autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à
sua efetivação."
Boa
parte dos municípios do Estado de São Paulo adotam a emissão da NFS-e - Nota
Fiscal de Serviços Eletrônica em que o contribuinte faz a emissão do documento
fiscal denominado "Recibo Provisório de Serviço", ou RPS, que é
encaminhado por meio eletrônico para os municípios e eles se encarregam de
emitir as correspondentes NFS-e. Os que ainda não adotaram o sistema de NFS-e,
o contribuinte emite as notas fiscais de forma convencional e entrega ao fisco
municipal a declaração dos valores dos serviços prestados no período. O
lançamento, em todos os casos, é efetuado mediante declaração do contribuinte.
Em
sendo a regra geral o lançamento ser feito por meio de declaração do
contribuinte e com base na documentação fiscal de emissão obrigatória, a
revisão do lançamento, todavia, pode ser feita pela autoridade tributária nos
casos previstos no art. 149 do CTN:
"Art.
149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa
nos seguintes casos:
I
- quando a lei assim o determine;
II
- quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na
forma da legislação tributária;
III
- quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos
termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação
tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade
administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a
juízo daquela autoridade;
IV
- quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento
definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;
V
- quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente
obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;
VI
- quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro
legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;
VII
- quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele,
agiu com dolo, fraude ou simulação;
VIII
- quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do
lançamento anterior;
IX
- quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta
funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de
ato ou formalidade essencial.
Parágrafo
único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o
direito da Fazenda Pública."
A
mera constatação de que o valor declarado pelo notário ou registrador ser
inferior à 62,5% do valor por ele declarado ao CNJ não implica, por si só, na
ocorrência de algum dos casos apontados nos incisos I a IX do dispositivo
citado, como falta de declaração ou esclarecimento, omissão, erro, inexatidão,
fraude, dolo ou simulação.
A
adoção da base de cálculo como sendo de 62,5% do valor declarado ao CNJ sem ser
apontada qualquer ocorrência dos fatos descritos no art. 149 do CTN constitui
um típico caso de lançamento fiscal feito por meio de ARBITRAMENTO, em que a
autoridade fiscal, descartando as declarações e documentação fiscal, substitui
a base de cálculo por um valor pré-definido segundo seus próprios critérios.
3.
Requisitos legais para o arbitramento.
O
arbitramento não pode ser utilizado de forma discricionária pelo fisco, de
forma diversa, somente pode ser feito nos casos específicos previstos no art.
148 do CTN:
"Art.
148. Quando o cálculo do tributo tenha por base, ou tome em consideração, o
valor ou o preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos, a autoridade
lançadora, mediante processo regular, arbitrará aquele valor ou preço, sempre
que sejam omissos ou não mereçam fé as declarações ou os esclarecimentos
prestados, ou os documentos expedidos pelo sujeito passivo ou pelo terceiro
legalmente obrigado, ressalvada, em caso de contestação, avaliação
contraditória, administrativa ou judicial."
O
primeiro requisito para o arbitramento é a abertura de um processo regular, ou
seja, sem o procedimento administrativo adequado, inadmissível será o
arbitramento. No procedimento administrativo, imperativo é a observância da
garantia do contraditório e da ampla defesa, conforme art. 5º, LV, da
Constituição Federal, e que se encontra reafirmado ao fim do texto do art. 148
acima.
O
segundo requisito é a constatação da omissão nas declarações do contribuinte ou
quando elas não merecerem fé. Fatos esses que não podem ser assumidos a priori
como ocorridos, visto haver a obrigatoriedade de ser dada oportunidade de
defesa e de produção das provas, somente ultrapassada essa fase é que, em uma
decisão fundamentada, o arbitramento poderia ser adotado se do conjunto
probatório se puder inferir ter havido omissão ou não ser idônea a documentação
apresentada.
Há
que ser ainda levado em conta que a utilização do valor de 62,5% do total
declarado ao CNJ nada mais é do que o estabelecimento de uma PAUTA FISCAL em
substituição aos valores declarados pelo contribuinte.
O
STJ já teve a oportunidade de examinar diversas vezes a matéria, a título
exemplificação, é aqui trazida a ementa do acórdão proferido no REsp 1.816.701,
j. 25/6/2019, com o seguinte teor:
"TRIBUTÁRIO
E PROCESSUAL CIVIL. IMPOSTO SOBRE SERVIÇO. ISS. LANÇAMENTO REALIZADO POR
ARBITRAMENTO. ART. 148 DO CTN. CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ.
1.
Cuida-se de inconformismo com acórdão do Tribunal de origem que manteve o valor
do lançamento informado pelo contribuinte, haja vista que a municipalidade não
apresentou nenhum indício de que os valores declarados como base de cálculo
para o tributo não são confiáveis.
2.
Averiguar a validade do lançamento lastreado em arbitramento importa no reexame
de provas, o que é vedado na instância especial, nos termos da Súmula 7/STJ.
Precedentes do STJ: AgRg no REsp 1.509.100/SC, ministro Herman Benjamin, 2ª
turma, DJe 21/5/2015; REsp 1.201.723/RJ, rel. ministro Mauro Campbell Marques,
2ª turma, DJe 6/10/2010; REsp 1.090.337/SP, rel. ministra Eliana Calmon, 2ª
turma, DJe 4/6/2009.
3.
Acrescente-se que a apuração do valor da base de cálculo do imposto pode ser
feita por arbitramento nos termos do art.148 do CTN quando for certa a
ocorrência do fato imponível e a declaração do contribuinte não mereça fé, em
relação ao valor ou preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos
registrados. Nesse caso, a Fazenda Pública fica autorizada a proceder ao
arbitramento mediante processo administrativo-fiscal regular, assegurados o
contraditório e a ampla defesa.
4.
Dessume-se que o acórdão recorrido está em sintonia com o atual entendimento
deste Tribunal Superior, razão pela qual não merece prosperar a irresignação.
Incide, in casu, o princípio estabelecido na súmula 83/STJ: "Não se
conhece do recurso especial pela divergência, quando a orientação do Tribunal
se firmou no mesmo sentido da decisão recorrida". Cumpre ressaltar que a
referida orientação é aplicável também aos recursos interpostos pela alínea
"a" do inciso III do art. 105 da Constituição Federal de 1988. Nesse
sentido: REsp 1.186.889/DF, 2ª turma, relator ministro Castro Meira, DJe de
2/6/2010.
5.
Recurso especial não conhecido."
O
entendimento acima vem seguido pelo STJ de longa data, veja-se o RMS 18.677,
julgado em 19/4/2005, contendo a seguinte ementa:
"TRIBUTÁRIO.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. ICMS. BASE DE CÁLCULO. PAUTA FISCAL.
ILEGALIDADE.
1.
Segundo orientação pacificada neste Corte, é indevida a cobrança do ICMS com
base em regime de pauta fiscal. Precedentes.
2.
O art. 148 do CTN somente pode ser invocado para a determinação da base de
cálculo do tributo quando, certa a ocorrência do fato imponível, o valor ou
preço de bens, direitos, serviços ou atos jurídicos registrados pelo
contribuinte não mereçam fé, ficando a Fazenda Pública, nesse caso, autorizada
a proceder ao arbitramento mediante processo administrativo-fiscal regular,
assegurados o contraditório e a ampla defesa.
3.
Ao final do procedimento previsto no art. 148 do CTN, nada impede que a
administração fazendária conclua pela veracidade dos documentos fiscais do
contribuinte e adote os valores ali consignados como base de cálculo para a
incidência do tributo. Do contrário, caso se entenda pela inidoneidade dos
documentos, a autoridade fiscal irá arbitrar, com base em parâmetros fixados na
legislação tributária, o valor a ser considerado para efeito de
tributação."
No
mesmo sentido podem ainda ser mencionados o REsp 1.790.898, REsp 1.696.942, e
AgRg 1.509.100.
No
TJ/SP, as três Câmaras de Direito Público especializadas em tributos municipais
(14ª, 15ª e 18ª), em inúmeras decisões, também sufragam o mesmo entendimento,
como na apelação cível 1007668-11.2021.8.26.0053, da 15ª Câmara:
"TRIBUTÁRIO
APELAÇÃO AÇÃO ORDINÁRIA ISS MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. Sentença que julgou
procedente a ação. Apelo do município.
ARBITRAMENTO
DA BASE DE CÁLCULO. Medida excepcional, cabível apenas quando as declarações do
sujeito passivo forem omissas ou não merecerem fé Inteligência do artigo 148 do
Código Tributário Nacional Doutrina Precedentes do C. STJ e deste E. TJ.
PAUTA
FISCAL Meio cabível de apuração de eventuais inconsistências e omissões nas
declarações e documentos apresentados pelo contribuinte, ante a possibilidade
de arbitramento prevista no art. 148 do CTN precedentes deste E. TJ.
No
caso, o município alega que procedeu ao arbitramento da base de cálculo do ISS
de acordo com a pauta fiscal em razão da dificuldade técnica de se fiscalizar a
construção de um empreendimento de grande porte (fls. 3.114/3.115).
Impossibilidade. Hipótese que não encontra amparo no art. 148 do CTN -
Inexistência de omissão ou indício de falsidade nos documentos fornecidos e nas
declarações prestadas pelo sujeito passivo Regularidade das notas fiscais
emitidas e da contabilidade da autora atestada por perícia (fls. 3.275/3.276).
Descabida a utilização dos valores fictícios previstos na pauta mínima.
Lançamento
anulado.
HONORÁRIOS
RECURSAIS Majoração nos termos do art. 85, §11 do CPC POSSIBILIDADE observância
ao disposto nos §§ 2º a 6º do art. 85, bem como aos limites estabelecidos nos
§§ 2º e 3º do respectivo artigo. Majoração da verba honorária em 1% do valor
atualizado da causa.
Sentença
mantida Recurso desprovido."
Da
14ª Câmara, pode ser invocada a apelação cível 1026982-69.2023.8.26.0053, com a
seguinte ementa:
"AÇÃO
ANULATÓRIA DE DÉBITO FISCAL. São Paulo. ISSQN. Sentença de procedência, para
declarar a inexigibilidade do tributo descrito na inicial. Irresignação da
Municipalidade ré. Descabimento. Lançamento complementar de ISSQN tendo como
base de cálculo valores estabelecidos em pauta fiscal. Hipótese em que não
restou demonstrada, mediante processo administrativo, omissão ou ausência de
credibilidade na prestação de informações pelo responsável tributário.
Inadmissibilidade, portanto, do arbitramento em tela. Inteligência do art. 148
do CTN. Precedentes. Inexigibilidade do tributo em exame bem reconhecida.
Sentença mantida. Aplicação do art. 252 do RITJSP. Majoração dos honorários
advocatícios de sucumbência em 1%, nos termos do §11 do art.85 do CPC. Recurso não
provido."
Quanto
à 18ª Câmara, segue o exemplo da apelação cível 1013923-24.2017.8.26.0053:
"APELAÇÃO
município de São Paulo ISS Adoção da pauta fiscal para fins de lançamento do
tributo Hipótese excepcional (art. 148 do CTN) Perícia contábil que atesta a
idoneidade das informações prestadas pelo contribuinte e a efetiva adoção da
pauta fiscal pelo Município Manutenção da sentença quanto à nulidade do
lançamento. Reforma da sentença apenas para determinar o cálculo dos honorários
de forma escalonada. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO."
Do
exposto, depreende-se que se encontra-se plenamente consolidada a
jurisprudência perante o STJ, bem como perante o TJ/SP, que o arbitramento
somente pode ser utilizado quando não merecerem fé as declarações do
contribuinte, sendo a esse também garantido o contraditório e ampla defesa.
4.
Fé pública do notário e do oficial de registro.
Os
notários e os oficiais de registro, no exercício de suas funções, são dotados
de fé pública nos termos do art. 3º, da lei 8.935, de 18/11/1994:
"Art.
3º Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são
profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício
da atividade notarial e de registro."
Em
conformidade com o texto legal, as certidões emitidas pelos notários e
registradores com respeito aos atos por ele praticados no exercício de suas
funções são dotadas de fé pública, ou seja, presumem-se verdadeiras até prova
em contrário. Diante da prerrogativa legal, os notários e os oficiais de
registro podem muito bem emitirem certidões em que sejam relacionados tudo o
que foi recebido dos usuários determinado período, com discriminação do dia,
nºs do RPS ou NF, as parcelas destinadas ao notário/oficial, ao Estado, à
Secretaria da Fazenda, ao TJ/SP, ao Registro Civil, às Santas Casas e ao
município.
Uma
vez emitida a certidão com a discriminação minuciosa de todos os valores
recebidos em cada RPS ou NF emitidos, com as parcelas especificadas para cada
destinatário, esse documento presume-se verdadeiro diante da fé pública legal
do emitente, não podendo ser refutado pela autoridade tributária enquanto não
for demonstrada a falsidade das declarações contidas na certidão. Negar a
veracidade das declarações contidas em certidão seria a mesma coisa que se
alegar ser falso documento, uma acusação de ter o notário ou o oficial de
registro praticado o crime de falsificação de documento público (art. 297 do
Código Penal), ficando o acusador, em não comprovando a falsificação, sujeito
às penas do crime de calúnia (art. 138 do CP).
5.
Exercício do contraditório e da ampla defesa.
É
fato raro o fisco municipal iniciar um procedimento prévio de arbitramento, na
grande maioria das vezes o fisco inicia sua ação com a lavratura do auto de
infração e imposição de multa em que o valor dos serviços já se encontra
arbitrado (ex. 62,5% dos valores declarados ao CNJ). Qualquer que seja o
procedimento, é prerrogativa do sujeito passivo apresentar a sua defesa.
Como
alegações de defesa, o primeiro ponto a ser apontado seria quanto à
inocorrência de qualquer dos fatos previstos no art. 148 e 149 do CTN que
pudessem justificar o lançamento feito por arbitramento, o segundo ponto seria
a impugnação do valor da base de cálculo atribuída, podendo ser juntada como
prova a certidão dos atos praticados tratado anteriormente no item 4 ou laudo
contábil demonstrando os valores reais dos atos praticados.
Em
caso de ser juntada a certidão dos atos praticados, a autoridade tributária
terá que adentrar no mérito da autenticidade das declarações contidas na
certidão para poder afastar os valores declarados para substituir pelos 62,5%
arbitrado.
6.
Equívoco na adoção dos 62,5% declarados ao CNJ como base de cálculo do
arbitramento.
É
frequente o equívoco em se assumir, a priori, que os emolumentos destinados ao
tabelião ou oficial sejam no importe de 62,5% referido no art. 19 da lei
estadual 11.331/02, percentual estabelecido quando da publicação da primeira
versão da tabela de emolumentos. A causa do equívoco é que não se levou em
consideração os demais dispositivos constantes da própria lei e nem as
modificações legislativas posteriores.
A
lei estadual 11.331/02 em sua redação original publicada no DOE de 27/12/2002,
estabelecia:
Art.
19 - Os emolumentos correspondem aos custos dos serviços notariais e de
registro na seguinte conformidade:
I
- relativamente aos atos de Notas, de Registro de Imóveis, de Registro de
Títulos e Documentos e Registro Civil das Pessoas Jurídicas e de Protesto de
Títulos e Outros Documentos de Dívidas:
a)
62,5% (sessenta e dois inteiros e meio por cento) são receitas dos notários e
registradores;
b)
17,763160% (dezessete inteiros, setecentos e sessenta e três mil, cento e
sessenta centésimos e milésimos percentuais) são receita do Estado, em
decorrência do processamento da arrecadação e respectiva fiscalização;
c)
13,157894% (treze inteiros, cento e cinqüenta e sete mil, oitocentos e noventa
e quatro centésimos de milésimos percentuais) são contribuição à Carteira de
Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça do Estado;
d)
3,289473% (três inteiros, duzentos e oitenta e nove mil, quatrocentos e setenta
e três centésimos de milésimos percentuais) são destinados à compensação dos
atos gratuitos do registro civil das pessoas naturais e à complementação da
receita mínima das serventias deficitárias;
e)
3,289473% (três inteiros, duzentos e oitenta e nove mil, quatrocentos e setenta
e três centésimos de milésimos percentuais) são destinados ao Fundo Especial de
Despesa do Tribunal de Justiça, em decorrência da fiscalização dos serviços;
II
- relativamente aos atos privativos do Registro Civil das Pessoas Naturais:
a)
83,3333% (oitenta e três inteiros, três mil e trezentos e trinta e três
centésimos de milésimos percentuais) são receitas dos oficiais registradores;
b)
16,6667% (dezesseis inteiros, seis mil seiscentos e sessenta e sete centésimos
de milésimos percentuais) são contribuição à Carteira de Previdência das
Serventias não Oficializadas da Justiça do Estado."
Esse
mesmo diploma ainda estabeleceu em seu art. 42:
"Art.
42. Passa a vigorar com a seguinte redação o art. 5º da lei 11.021, de 28 de
dezembro de 2001:
"Art.
5º Os valores devidos em virtude desta lei constarão das tabelas previstas na
lei 4476, de 20 de dezembro de 1984, e alterações posteriores que a venham
substituir (NR)"" .
O
objetivo do art. 42 foi o de reafirmar a vigência da lei estadual 11.021/01,
que dispôs:
"Art.
2º Em todos os atos extrajudiciais, excetuados os previstos no § 1º do artigo
1º da lei federal 6.015, de 31 de dezembro de 1973, será cobrada uma
contribuição de solidariedade às Santas Casas de Misericórdia, estabelecidas no
Estado de São Paulo, cujo valor será igual à 1% (um por cento) dos emolumentos
devidos ao Escrivão."
Verifica-se
que, desde a publicação da lei 11.331/02, os percentuais estabelecidos não
correspondiam ao que de fato eram cobrados dos usuários em razão do acréscimo
de 1% destinado às Santas Casas para atos de notas e protesto.
Atente-se
ao fato de que os percentuais estabelecidos no art. 19 não se aplicam a todos
os casos, visto que essa mesma lei já previa casos de isenção em seu art. 8º:
"Art.
8° A União, os Estados, o Distrito Federal, os municípios, e as respectivas
autarquias, são isentos do pagamento das parcelas dos emolumentos destinadas ao
Estado, à Carteira de Previdência das Serventias não Oficializadas da Justiça
do Estado, ao custeio dos atos gratuitos de registro civil e ao Fundo Especial
de Despesa do Tribunal de Justiça.
Parágrafo
único - O Estado de São Paulo e suas respectivas autarquias são isentos do
pagamento de emolumentos."
Pela
promulgação da lei estadual 15.600, de 11/12/2014, houve importante modificação
que impactou o montante pago pelos usuários:
"Art.
1º O art. 19 da lei 11.331, de 26 de dezembro de 2002, passa a vigorar
acrescido do seguinte parágrafo:
"Art.
19 (...).
Parágrafo
único. São considerados emolumentos, e compõe o custo total dos serviços
notariais e de registro, além das parcelas previstas neste artigo, a parcela
dos valores tributários incidentes, instituídos pela lei do município da sede
da serventia, por força de lei complementar federal ou estadual."
Houve,
com isso, nova alteração dos percentuais porque ficou acrescido aos emolumentos
o valor correspondente ao ISSQN incidente sobre a prestação dos serviços
notariais e registrais.
As
alterações dos percentuais não ficaram por aí, com a promulgação da lei
estadual 15.855/15, dos 13,157894% originais da Carteira de Previdência foram
retirados 4%, sendo 1% acrescido ao valor destinado ao Tribunal de Justiça e
3%, como repasse novo, ao Ministério Público:
"Art.
3º Os dispositivos adiante mencionados da lei 11.331, de 26 de dezembro de
2002, ficam assim alterados:
...
II
- as alíneas "c" e "e" do inciso I do artigo 19 passam a
vigorar com nova redação, e é acrescentada a esse inciso a alínea
"f", na seguinte conformidade:
"Art.
19 ...
I
- ...
c)
9,157894% (nove inteiros, cento e cinquenta e sete mil, oitocentos e noventa e
quatro centésimos de milésimos percentuais) são contribuição à Carteira de
Previdência das Serventias Não Oficializadas da Justiça do Estado;
...
e)
4,289473% (quatro inteiros, duzentos e oitenta e nove mil, quatrocentos e
setenta e três centésimos de milésimos percentuais) são destinados ao Fundo
Especial de Despesa do Tribunal de Justiça, em decorrência da fiscalização dos
serviços;
f)
3% (três por cento) são destinados ao Fundo Especial de Despesa do Ministério
Público do Estado de São Paulo, em decorrência da fiscalização dos serviços;
(NR)"
Para
compensar o que havia sido destinado ao Ministério Público, o legislador
decidiu criar uma outra verba adicional, fora dos totais já previstos,
estabelecendo um acréscimo como compensação. Como os 3% retirados equivaliam,
aritmeticamente, a 4,8% dos emolumentos do titular (4,8% de 62,5% = 3%), a lei
estadual 16.346, de 29/12/2016, estabeleceu:
"Art.
1º Os dispositivos adiante indicados da lei 11.331, de 26 de dezembro de 2002,
passam a vigorar com a seguinte redação:
II
- o parágrafo único do artigo 19:
"Art.
19. ...
Parágrafo
único. São considerados emolumentos, e compõem o custo total dos serviços
notariais e de registro, além das parcelas previstas neste artigo:
2
- a parcela destinada à Carteira de Previdência das Serventias Notariais e de
Registro - Carteira das Serventias em montante correspondente a 4,8% (quatro
inteiros e oito décimos percentuais) sobre o valor da parcela prevista na
alínea "a" do inciso I deste artigo." (NR)"
O
adicional de 4,8% destinado à Carteira de Previdência não foi criado para fazer
parte dos percentuais originais da tabela, mas como um item a ser acrescentado
ao total pago pelos usuários, juntamente com o 1% destinado às Santas Casas e o
percentual correspondente ao ISSQN.
Com
a extinção do IPESP pela lei Estadual 16.877, de 19/12/2018, os valores
destinados à Carteira de Previdência das Serventias Notariais e de Registro
foram destinados à Secretaria da Fazenda:
"Art.
11. Os dispositivos adiante indicados do artigo 19 da Lei nº 11.331, de 26 de
dezembro de 2002, passam a vigorar com a seguinte redação:
I
- a alínea "c" do inciso I:
"c)
9,157894% (nove inteiros, cento e cinquenta e sete mil, oitocentos e noventa e
quatro centésimos de milésimos percentuais) são contribuição à Secretaria da
Fazenda;" (NR)
II
- a alínea "b" do inciso II:
"b)
16,6667% (dezesseis inteiros, seis mil seiscentos e sessenta e sete centésimos
de milésimos percentuais) são contribuição à Secretaria da Fazenda;" (NR)
III
- o item 2 do parágrafo único:
"2
- a parcela destinada à Secretaria da Fazenda em montante correspondente a 4,8%
(quatro inteiros e oito décimos percentuais) sobre o valor da parcela prevista
na alínea "a" do inciso I deste art.." (NR)"
Fora
os casos já citados de alteração dos percentuais pela própria lei estadual, há
que ser ainda levadas em conta as normas gerais para a fixação dos emolumentos
de que tratou o § 2º do art. 236 da Constituição Federal:
"§
2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos
aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro."
As
normas gerais sobre os emolumentos foram especificadas na lei federal 10.169,
de 29/12/2000, sendo relevante aqui ser trazido o texto de seu art. 2º, § 2º,
que foi incluído pela lei federal 13.986, de 7/4/2020, que dispôs:
"§
2º Os emolumentos devidos pela constituição de direitos reais de garantia
mobiliária ou imobiliária destinados ao crédito rural não poderão exceder o
menor dos seguintes valores:
I
- 0,3% (zero vírgula três por cento) do valor do crédito concedido, incluída a
taxa de fiscalização judicial, limitada a 5% (cinco por cento) do valor pago
pelo usuário, vedados quaisquer outros acréscimos a título de taxas, custas e
contribuições para o Estado ou Distrito Federal, carteira de previdência ou
para associação de classe, criados ou que venham a ser criados sob qualquer
título ou denominação;"
Do
exposto fica evidenciado que o imposte de 62,5% previsto no art. 19, I, a, da
lei estadual 11.331/02 não corresponde exatamente à parcela destinada ao
notário/registrador em razão dos dispositivos outros da lei que foram
posteriormente alterados criando parcelas adicionais, sem contar ainda com a
isenção concedida aos municípios e da limitação na cobrança nos casos dos
registros dos títulos referentes ao crédito rural.
7.
Conclusões.
A
regra geral para o lançamento do ISS são as declarações prestadas pelo
contribuinte por meio das notas fiscais por ele emitidas ou pelas remessas ao
Fisco dos Recibos Provisórios de Serviço, a não aceitação das declarações e
documentos fiscais deve ser precedida de regular procedimento administrativo,
garantido o contraditório e ampla defesa, quando ficar caracterizada a omissão
ou não merecimento de fé das declarações ou esclarecimentos prestados (art. 148
do CTN).
O
arbitramento é ato decorrente do procedimento administrativo de reconhecimento
da inidoneidade das declarações e documentação fiscal, não podendo ser feito de
ofício pelo Fisco.
O
notário e o registrador, diferentemente dos demais contribuintes, são dotados
de fé pública e podem emitir certidão relacionando todos os atos praticados e
valores recebidos como emolumentos. A fé pública da certidão somente pode ser
afastada provando-se a sua falsidade, negar a sua validade seria a mesma coisa
da alegação falsificação de documento público, ficando o acusador sujeito às
penas do crime de calúnia.
Em
razão das diversas alterações legislativas supervenientes, o percentual de
62,5% do montante recebido não reflete a parcela dos emolumentos destinada aos
notários e registradores.
Fonte:
Migalhas